Poucos dias depois de se sagrar campeão na China, ao serviço do Shanghai SIPG, quebrando os sete anos de hegemonia do «todo-poderoso» Guangzhou Evergrande na Superliga chinesa, Vítor Pereira explicou que a consistência foi o segredo da sua equipa.

«Fomos consistentes: do ponto de vista ofensivo e defensivo, fomos uma equipa equilibrada», afirmou em entrevista à Lusa, o técnico que conquistou o título inédito para o Shanghai SIPG, na prova máxima da China.

Vítor Pereira, que em dezembro de 2017 sucedeu a André Villas-Boas no comando do Shanghai SIPG, sagrou-se campeão, na semana passada, na época de estreia na equipa de Xangai, tal como tinha acontecido em 2011, no FC Porto, depois de também ter substituído o compatriota.

«Só quem está aqui na China é que entende a dimensão do feito. O Guangzhou é, de facto, o todo-poderoso da China, campeões durante sete anos consecutivos, com largos anos de trabalho e jogadores com muita qualidade. Entre os jogadores chineses da minha equipa, nenhum tinha sido campeão», lembrou.

O técnico português lembrou ainda que a sua equipa conseguiu colmatar algumas carências do plantel recorrendo à polivalência dos jogadores.

«Nunca tivemos muitas soluções em termos de número de jogadores, vivemos muito da polivalência, tive um jogador que jogou nas posições quase todas e foi assim que fomos colmatando esse problema», disse.

Erros de gestão

O técnico natural de Espinho, que se tornou no terceiro treinador luso a conquistar o título em três países, juntando-se a Artur Jorge e José Mourinho, admitiu alguns erros na gestão da carreira.

«Cometi alguns erros estratégicos de percurso. Hoje, à distância, entendo», disse o treinador que se mudou para a China, após uma passagem pela segunda divisão alemã, onde não evitou a despromoção do TSV 1860 Munique.

«Foi uma experiência muito difícil e um risco muito grande na minha carreira: depois de sair do Fenerbahçe [histórico clube turco], ir para a segunda divisão alemã, para um clube que estava a passar uma fase de muitos problemas», descreveu o técnico à agência Lusa, dizendo que «foi uma exceção na carreira».

«Gosto de jogar para ganhar títulos, gosto de qualidade. Na Alemanha tive esse grande problema, esse contraste, entre aquilo que queria e aquilo que eles me podiam dar», acrescentou.

Dinheiro levou à saída do FC Porto

Vítor Pereira começou por treinar nas camadas jovens (Padroense e FC Porto) antes de assumir o primeiro conjunto sénior, o Sanjoanense, em 2005.

Na época seguinte foi para o Sporting de Espinho, antes de voltar à formação dos dragões e assumir o comando do Santa Clara, onde se começou a destacar, merecendo de novo a confiança do FC Porto, desta vez para ser adjunto na equipa técnica de André Villas-Boas, em 2010/11.

A saída de Villas-Boas levou o presidente do FC Porto, Pinto da Costa, a apostar em Vítor Pereira para treinador principal e o técnico acabou por se sagrar bicampeão e vencer duas Supertaças portuguesas, entre 2011 e 2013, mas acabou por rumar à Arábia Saudita, para treinar o Al-Ahli.

«Foi uma questão financeira: achei que não podia desperdiçar a oportunidade», contou.

No regresso à Europa, para treinar os gregos do Olympiacos, Vítor Pereira sagrou-se campeão e venceu a Taça da Grécia, antes de rumar ao Fenerbahçe, de onde resolveu sair, na segunda época, devido a «desentendimentos com o ponto de vista do presidente».

Interesse em continuar na China

O treinador disse não estar «nada arrependido» de ter rumado à China, onde o Governo está a impulsionar o futebol, visando elevar a seleção chinesa ao estatuto de grande potência.

«É um campeonato muito mais competitivo do que aquilo que eu imaginei. Tem jogadores de qualidade, cada vez mais, porque a China tem capacidade para investir», afirmou.

O técnico disse ainda ser bem tratado em Xangai, a capital económica do país, onde «não falta nada» e sente que o seu trabalho é valorizado: «Sinto-me bem. Vivo bem. Estou numa cidade onde, como nas grandes cidades europeias, não falta nada, apesar de estar numa cultura diferente».

«Estou interessado em continuar, o clube também está: não esperou pelo fim para manifestar esse interesse. Há dois meses, já tinham manifestado todo o interesse para eu continuar. Isso revela também respeito e consideração», disse.

Abrir portas

Vítor Pereira considera a capacidade de adaptação uma qualidade dos portugueses, «fundamental» para vencer na China, onde se sagrou na semana passada campeão pelo Shanghai SIPG.

«Um dos segredos do treinador português é ter essa capacidade: chegamos a qualquer lado e adaptamo-nos».

«Mesmo em circunstâncias muito diferentes daquelas a que estamos habituados, rapidamente conseguimos perceber o meio, o que temos e as condições para atingir o sucesso. E temos visto muitos treinadores portugueses por esse mundo fora a dar cartas», descreveu.

O técnico lembrou ainda que «por cada título que se consegue ou cada trabalho bem feito, abrem-se portas» para mais treinadores portugueses.

Quase 100 treinadores portugueses de futebol vivem, atualmente, no país asiático, desde a província de Jilin, na fronteira com a Coreia do Norte, até à ilha tropical de Hainan, no extremo sul do país.

Alguns são contratados por clubes e outros estão integrados no sistema de ensino público, que incluiu em 2015 a modalidade no desporto escolar, parte de um «plano de reforma do futebol» decretado pelo governo, visando elevar a seleção chinesa ao estatuto de grande potência.