O Al Ahly tenta recuperar a normalidade de uma equipa de futebol e Manuel José voltou a orientar os treinos da equipa egípcia. O técnico português relata um cenário ainda difícil e com «sinais inequívocos de medo». A tragédia de Port Said foi há três semanas, mas ainda está presente no dia a dia.

«Começámos a treinar, é uma situação difícil, mas lentamente a alegria vai reaparecendo», começou por contar Manuel José ao Maisfutebol, depois de « uma tragédia tremenda, com contornos muito complicados» e na qual morreram 74 pessoas.

No seio do Al Ahly, ainda se tentam ultrapassar dramas causados pelo que aconteceu no jogo com o Al Masry. Os jogadores têm tido apoio psicológico, mas isso pode não chegar, como explica o treinador: «Tenho um jogador, o Barakat, que quer deixar de jogar. Já todos falámos com ele, mas ele mostra-se renitente, está afetado ainda.»

Manuel José refere que «o ambiente é frio» e que todos os dias se confronta com situações das famílias das vítimas. «Hoje [terça-feira], no treino da tarde, apareceram dois rapazes, um deles com a perna partida porque atirou-se da bancada, para não morrer», narra.

No entanto, «a vida começa a refazer-se» e no fim de semana o Al Ahly parte para os Emirados Árabes Unidos. Ou seja, o clube tenta voltar aos hábitos de uma equipa de futebol.

«Mas a federação cancelou os jogos da seleção, o que é uma prova inequívoca de medo, de fragilidade», explica Manuel José. O treinador português é, aliás, contra essa medida.

«Para mim, não tinha de cancelar, mas sim arranjar condições de segurança porque aquilo foi um massacre organizado, não teve a ver com futebol, estou vivo por causa disso», garante ao Maisfutebol.

«Recuso-me a depor, até podem prender-me»

A tragédia de Port Said teve consequências graves. O selecionador e treinador do Zamalek apresentam as condolências ao Al Ahly nesta quarta-feira, num ato de apoio. «Não conseguimos restituir a vida às pessoas, mas todos temos de ter sentido de solidariedade», argumenta o técnico luso.

A investigação aos incidentes de Port Said prossegue. Manuel José confessa que alguns futebolistas já fizeram depoimentos às autoridades. Algo que o técnico recusa.

«Podem prender-me que não faço depoimento nenhum, porque nunca vão encontrar quem organizou aquilo. Podem apanhar quem matou, quem organizou nunca o irão conseguir», concluiu, ainda afetado pelos acontecimentos de 1 de fevereiro.