*Enviado-especial ao Brasil

Primeiro o óbvio: jogaço!

Agora o resto.

A Holanda deu um valente murro no orgulho espanhol e atirou ao chão o campeão do mundo, instalado no trono do futebol desde o Euro 2008. Nunca um detentor do título começara tão mal a sua defesa. O que aconteceu esta noite em Salvador fará parte dos livros de história do futebol.

FICHA DE JOGO

Talvez seja cedo para dizer que o tiki-taka morreu às mãos da laranja mecânica, mas que o conceito merecerá outra revisão não há dúvidas. Os rostos espanhóis enquanto o jogo se arrastava para o apito final dizem tudo: houve vexame no Arena Fonte Nova. 

E com isso até ganha menos importância, o facto de a tradição ter sido cumprida: quando a final de um Mundial é reeditada no torneio seguinte, nunca o vencedor é o mesmo. A Holanda fez questão de manter a regra, vingando a derrota de há quatro anos. Mas com um estilo nunca visto. A amostra ainda é curta mas este Espanha-Holanda cumpriu as expectativas e já é o melhor jogo do Mundial.

Para isso também contribuiu, convém dizer, o golo de Van Persie. Vão passar meses, anos, talvez décadas, mas quem tiver memória futebolística não vai esquecer a forma como o avançado holandês fez um chapéu perfeito, de cabeça, a Iker Casillas no Arena Fonte Nova, em Salvador.

DESTAQUES DO JOGO

É justo, portanto, que se comece pelo ponto alto do jogo. Também porque, para além da beleza, foi o momento decisivo. O ponto de viragem. A Holanda, então facilmente manietada por uma Espanha a jogar no registo habitual, ganhou confiança, cresceu e partiu para um segundo tempo avassalador, confirmando a reviravolta e enchendo as medidas a quem desconfiava.

Esta Holanda não tem o mesmo star-power de outros anos, sobretudo na linha mais defensiva. Mas pode ser uma bela surpresa. A primeira amostra, pelo menos, é apetecível. E está feito o mais difícil para passar o grupo.

Está controlado, não estava?

Voltemos, agora, ao início. E o princípio desta história teve ares da noite gélida de Joanesburgo. Casillas brilhara, então, com a ponta do pé, a evitar o golo de Robben. Na quente Salvador, foi a luva direita a tirar a primeira oportunidade flagrante dos holandeses.

Robben agora assistiu, mas Sneijder teve o mesmo sucesso do companheiro, há quatro anos.

E tal como nesse jogo, a Espanha ganhou confiança nesse lance até marcar. Diego Costa, sempre muito assobiado a cada toque na bola, recebe um passe de Xavi, roda e é tocado, ao de leve, por De Vrij. Niccola Rizzoli, o árbitro, estava em cima e apitou de imediato. Xabi Alonso não falhou.

O golo parecia lógico. Espanha estava melhor e até podia ter feito o segundo, por David Silva, que num lance parecido com o de Sneijder, não conseguiu deixar o jogo controlado às portas do intervalo.

Veio então o golaço de Van Persie, mais o descanso e a inversão de papéis.

O segundo tempo foi um filme totalmente diferente, com uma Holanda que ainda não se vira, mas que voltou cheia de vontade. A laranja voltou a ser mecânica e desfez em cacos o relógio espanhol. Tiki-Taka? Já era. Feito em pó por onze holandeses doidos varridos para o futebol.

Robben, quase a fazer troça dos centrais espanhóis, fez o 2-1 logo no início, em nova assistência de Blind. Van Persie atirou à trave ainda antes de se completar uma hora de jogo. Espanha parecia estar prestes a ir ao tapete. E foi.

Num lance discutível, De Vrij fez o terceiro, após canto e aparente carga de Van Persie em Casillas. O mesmo Van Persie bisou pouco depois, aproveitando o desnorte evidente do guarda-redes espanhol. Golo oferecido, goleada construída.

O quinto, para uma «manita», foi de novo de Robben, numa fase de completo desnorte espanhol. E não houve mais por desacerto holandês…

Del Bosque vai ter de juntar os cacos e procurar a melhor cola para devolver o orgulho a este grupo de jogadores nada habituado a vergonhas tão expostas.

O que aconteceu em Salvador esta noite só pode ser visto de uma forma: banho de bola histórico.