O dia 30 do Mundial-2014 em cinco pontos:

1.
O que esperar do Brasil-Holanda de amanhã? Na crónica de ontem já deixei bem clara a minha opinião: para mim, o jogo de Brasília não deveria existir, porque se trata de uma partida entre derrotados que gostariam de estar no Maracanã, no domingo, nos lugares de Alemanha e Argentina. Mas como vai mesmo acontecer, importa antecipar que tipo de jogo nos reserva. Não acredito em nova «débacle» do Brasil, pelo menos com o volume que o «pesadelo de Belo Horizonte» revelou. E o facto é que este escrete de Scolari tem a sua última oportunidade de mostrar que o «Mineirazzo» foi algo parecido com o enorme acidente de percurso. Já não salvaria a frustração, mas um eventual triunfo sobre a Holanda, com exibição agradável, poderia, como pediu Neymar, permitir que, ao menos, os jogadores do escrete terminassem a Copa «com um sorriso». Numa meia-final, ou numa final, a Holanda talvez tivesse ligeiro favoritismo sobre este Brasil. Se nos lembrarmos do que a laranja fez à Espanha no primeiro jogo, e do desastre defensivo do Brasil com a Alemanha ou até na meia-hora final com a Colômbia, a junção poderia ser explosiva.

2. Mas a partida deste sábado tem tudo para vir a ter características diferentes. Terá, quase de certeza, menos intensidade. E isso talvez beneficie o Brasil, que assim poderá ter mais posse, correndo menos riscos de vir a ser surpreendido. E há uma boa notícia para a segurança defensiva do Brasil, conceito que implodiu em Belo Horizonte: Thiago Silva, o capitão e líder, está de regresso. Falta saber se Felipão mantém David Luiz, um dos protagonistas do descalabro emocional e tático. Outros jogadores que estiveram especialmente mal com a Alemanha, como Marcelo, Fred ou Hulk, também devem perder a titularidade. Mas o jogo de terceiro ou quarto não será, propriamente, o momento ideal para testar soluções para o futuro. A ideia, para o Brasil, será mesmo puxar do brio e mostrar que, depois da humilhação com a Alemanha, o orgulho ferido do escrete ainda chega para atingir o pódio.

3. E depois de Scolari? José Maria Marin, o contestado presidente da CBF que promoveu o regresso de Felipão em novembro de 2012, garante só querer técnicos brasileiros. E, nesse cenário, Tite parece recolher francas preferências da «mídia» e dos adeptos brasileiros. É experiente, sem estar em final de carreira (53 anos), foi campeão do Mundo de clubes pelo Corinthians, em dezembro de 2012, e mostra alguns princípios de trabalho e de organização táctica superiores à média dos treinadores brasileiros. Mas os problemas do futebol canarinhos são mais vastos. Exigem uma mudança de mentalidades e isso passa, essencialmente, pelos clubes, que ao longo do ano insistem num paradigma resultadista, que condena os treinadores a um tempo de vida muito curto. A falta de planeamento, a desorganização, a instabilidade, o desaproveitamento do talento existente nas «categorias de base» vão adiando o salto que, como ficou claramente visto neste Mundial, o futebol brasileiro ainda não conseguiu dar. Será possível regressar à pureza do talento técnico, aliado a uma melhor organização? E será que isso exigirá a contratação de um selecionador estrangeiro? Aparentemente, isso só será possível se Marin mudar de ideias ou se a questão do técnico for adiada até ao início do próximo ano, quando Marco Polo Del Nero, ainda presidente da federação paulista e presidente eleito da CBF, tomar posse.

4. O «melhor jogador do Mundial» é um título que só fará sentido atribuir depois da final do Maracanã. Tendo em conta os dois finalistas, é um dado praticamente adquirido que será ou alemão ou argentino. Não é, por isso, de estranhar que a lista de dez candidatos, divulgada esta sexta à tarde pela FIFA, sete sejam dos dois finalistas. Kroos, Lahm, Hummels e Muller pela Alemanha (Schweinsteiger também podia ter entrado) e ainda Messi, Di Maria e Mascherano, pela Argentina. Se a «Pulga» for a figura da final do Maracanã, nem é preciso puxar muito mais pela cabeça. Do lado alemão, como a força é coletiva, será difícil apontar uma só estrela, porque, na verdade, a «estrela» é o conjunto. Olhando para todos os jogos já feitos pela «Mannschaft» no Brasil-14, talvez seja Kroos o principal candidato, com Lahm o menos provável dos quatro. Só há três não alemães/argentinos no top10: Robben (se for extraordinário em Brasília ainda não terá perdido todas as esperanças, se nos lembrarmos que há quatro anos o vencedor foi o uruguaio Forlán), James (vítima da eliminação da Colômbia nos quartos, caso contrário talvez fosse mesmo ele) e Neymar (mais pela simbologia). E, como sempre acontece nestes rankings, faltam alguns nomes que entrariam facilmente, pelo que fizeram: Pogba, Matuidi, Benzema, Cuadrado, Bryan Ruiz... Quanto aos guarda-redes, de novo a influência dos finalistas a colocar o argentino Romero nos três nomeados para «A Luva de Ouro». O prémio está destinado a Neuer, mas Keylor Navas, o outro nomeado, não deslustraria, se vencesse.

5. A comunicação dos jogadores alemães neste Mundial merece atenção. Porque está a ser especialmente bem feita. Em sintonia com o comportamento que os futebolistas germânicos têm tido em campo, tem sido um desempenho focado, sóbrio, mas muito competente e eficaz. A seguir à goleada histórica com o Brasil, jogadores como Schweinsteiger fizeram questão de recordar que, em miúdos, sempre apreciaram os melhores craque brasileiros. Hummels até explicou que não houve «pacto» ao intervalo, que apenas tinha dito que não queriam humilhar o Brasil, mas que iriam dar o melhor. E Podolski, mesmo só tendo jogador 54 minutos, tem assinado posts em português, muito apreciados pelos brasileiros, em que pede que se «respeita a amarelinha». As vitórias, num Mundial, não são só dentro do campo.

«Do lado de cá» é um espaço de opinião da autoria de Germano Almeida, jornalista do Maisfutebol, que aqui escreve todos os dias durante o Campeonato do Mundo. Germano Almeida é também responsável pelas crónicas «Nem de propósito» e pela rubrica «Mundo Brasil», publicadas na revista MF Total. Pode segui-lo no Twitter ou no Facebook