O dia 16 do Mundial-2014 em cinco pontos:

1. O que falhou na Seleção no frustrante Brasil-14 para Portugal? Essencialmente, aquela inacreditável goleada de 0-4 com a Alemanha. Quase tudo o resto (ou tudo, mesmo) foi condicionado pelo péssimo primeiro jogo. Mas isso não caiu do céu: teve a ver com descontrolo emocional depois do penálti marcado para os alemães e, sobretudo, no momento (imperdoável, na minha opinião) da expulsão de Pepe. Portugal foi a única seleção vítima da diferença de golos nas contas do apuramento. E só o Equador também caiu, como nós, com quatro pontos. Moral da história: os oitavos não só eram «possíveis» como estiveram relativamente perto. Também falharam outras coisas essenciais: Paulo Bento não foi capaz de identificar a necessidade de mudar o meio-campo do primeiro para o segundo jogo. O que fez (e bem) no terceiro, dar a titularidade a William Carvalho e Ruben Amorim, devia ter sido feito na partida com os EUA. Se tal tivesse acontecido, talvez estivéssemos a festejar o apuramento, por esta hora. Seja como for, o trauma da humilhação alemã ficou muito presente ainda no duelo de Manaus com os americanos. O encontro com o Gana mostrou que o apuramento era não só possível como exigível.

2. E agora? Que caminho deve tomar a Seleção no pós-Mundial e perspetivando o Euro-2016 em França? Nestes textos, o Luís Sobral, o Filipe Caetano e o Vítor Hugo Alvarenga já avançaram com boas ideias. Acrescento só mais uma ou outra. Na minha opinião, Paulo Bento deve ficar. O balanço do seu trabalho desde o dia 1 como selecionador continua a ser positivo. Tem contrato até 2016. Dá mostras de querer cumpri-lo até ao fim. A Federação mostra vontade em tê-lo como selecionador até ao fim desse período. Não me esqueço que é o mesmo treinador que quase levava Portugal à final do Euro-12 (merecia). Mas é fundamental analisar o que falhou, desta vez. E as conclusões têm que gerar consequências. Renovação? Sim, mas para isso é preciso haver matéria-prima para a fazer. Jogadores a introduzir, de forma progressiva, nesta Seleção: William Carvalho (a titular de forma crónica, já é o melhor na sua posição); Rafa (a jogar, não só nos 23); André Gomes; Adrien; Bebé; Ivan Cavaleiro, alguns mais (não muitos, infelizmente). Concordo com Paulo Bento quando diz que isso tem que ser feito de forma gradual. Já não percebo muito bem a ideia que o selecionador defendeu de que «é por gratidão» que mantém alguns jogadores (terá sido por isso que pôs Veloso e não William no onze frente aos EUA)? Não éramos os melhores do Mundo até 16 de junho, não passámos a ser os piores do Mundo no dia 26. Esta Seleção já foi das 4/6 melhores das competições em que entrou na última década e meia. Infelizmente, agora já não. Convém habituarmo-nos a isso e preparar os próximos anos. Isso exige planeamento e trabalho da Federação, mas também dos clubes.

3. Não estou completamente rendido à tese dominante de que este Mundial está a revelar o «fracasso europeu». Na fase de grupos, há essencialmente duas seleções europeias que desiludiram: Espanha (campeã falhada) e Portugal (por aqueles péssimos dois jogos iniciais). Um pouco também a Itália, vítima do fenómeno Costa Rica, mas a derrota com o Uruguai não foi propriamente surpresa. Inglaterra e Rússia foram quedas mais ou menos esperadas. Em compensação, convém não esquecer as confirmações (Alemanha, Holanda, França, Bélgica, sendo que os belgas até venceram os três jogos) e ainda os apuramentos da Suíça (não era líquido que se apurasse em grupo com Equador) e da Grécia de Fernando Santos. É verdade que metade dos 16 apurados são seleções do continente americano e isso mostra alguma vantagem territorial. Mas o histórico de mundiais recentes mostra-nos que a diferença não é assim tão grande. A Costa Rica será a grande sensação, os EUA nem tanto assim (também passaram aos oitavos há quatro anos). Maior surpresa serão as duas seleções africanas (Nigéria e Argélia), sobretudo a seleção magrebina, com o sportinguista Slimani em grande destaque.

4. Grande fase de grupos: enorme percentagem de jogos interessantes e emotivos; recorde de 136 golos marcados (média de 2,83 por jogos, nunca se marcou tanto desde que há 32 seleções na fase final do Mundial, bem mais que os 101 de há quatro anos e só no México-70 se assistiu a média melhor); reviravoltas no marcador; boas surpresas. Acompanho avidamente os Mundiais desde 1986 (no Espanha-82 só tinha quatro anos e confesso que só conheço o que vi mais tarde em imagens), mas posso garantir que o Brasil-2014 está a ser o melhor Mundial dos últimos 28 anos. Em contracorrente: a tendência era a de vermos menos golos e menos espetáculo. Estamos a ser brindados com mais momentos para recordar, como aquele voo de Van Persie no Espanha-Holanda, ou o tiraço de Tim Cahill no Austrália-Holanda, ou a exibição monumental de Ochoa no Brasil-México, o «hat-trick» de Shaqiri no Suíça-Honduras, os belos golos de Neymar e Messi. E tanto mais: o sucesso surpreendente mas justíssimo da Costa Rica, a recuperação espetacular do Uruguai, à custa de um Suarez que depois nos surpreendeu pelo pior e saiu do Brasil em lágrimas.

5. A parte mais intensa do Mundial, aquela que nos oferece dois ou três, às vezes quatro, jogos todos os dias, sem parar, terminou ontem. Os oitavos começam já este sábado, a partir de agora é «mata-mata». Robben, Neymar e Messi, maiores craques. Falta identificar a «super equipa». A Alemanha não confirmou com Gana e EUA ser assim tão imbatível, depois da goleada a Portugal. Brasil a crescer, mas ainda muito dependente do génio de Neymar e a acusar demasiada previsibilidade de processos. Argentina a valer-se de Messi, também ele genial quando é preciso para resolver, a esconder problemas inesperados do coletivo. França muito forte ofensivamente e com coletivo dos mais equilibrados. Holanda goleadora, mas desequilibrada. Não sei se elimina o México nos oitavos. Muita expetativa em torno do que ainda fará a Colômbia, talvez a seleção mais entusiasmante da primeira fase, com James candidato a craque da prova e Jackson a faturar. Em Mundial que já teve algumas «finais antecipadas», quem vencer os prováveis «quartos» entre França e Alemanha pode ser o próximo campeão. Possíveis conjugações até à final: QUARTOS, Brasil-Colômbia, França-Alemanha, Argentina-EUA, Holanda-Grécia. MEIAS, Brasil-Alemanha (ou França...); Holanda-Argentina. FINAL: Brasil (ou Alemanha ou França...)-Argentina ou Holanda. Isto promete!

«Do lado de cá»
é um espaço de opinião da autoria de Germano Almeida, jornalista do Maisfutebol, que aqui escreve todos os dias durante o Campeonato do Mundo, sempre às 23.30h. Germano Almeida é também responsável pelas crónicas «Nem de propósito» e pela rubrica «Mundo Brasil», publicadas na MFTotal. Pode segui-lo no Twitter ou no Facebook.