«Fomos a única equipa que tentou ganhar o jogo»
MARCO SILVA, treinador do Sporting, após o empate com o Benfica

«Os jogadores criativos do Sporting e do Benfica não apareceram no jogo individualmente porque as duas equipas souberam anular o um contra um.»
JORGE JESUS, treinador do Benfica, após o dérbi de Alvalade
 

O que ficou do Sporting-Benfica?

Que dificilmente o conjunto de Marco Silva chegará ao título (embora não seja impossível).

Que o Benfica se mantém como principal candidato (apesar de, num par de semanas, ter perdido oportunidade de ouro para chegar a nove pontos de avanço sobre o FC Porto, caso vencesse em Paços, e estar agora «só» com quatro pontos à maior sobre o segundo).

E algumas coisas mais.

Não foi um dérbi excitante, dentro do campo. Fora, até foi: enchente em Alvalade, clima aparentemente normal nos dias anteriores ao jogo e muito tenso depois dele (que até chegou ao corte de relações institucionais por parte do Sporting).

Mas centremo-nos então em coisas que interessem. No futebol, no jogo. Não no resto.

O espetáculo soube a pouco. Gaitán, que a par de Jackson e Nani será talvez um dos três melhores jogadores da Liga portuguesa, falhou a chamada. Nani jogou, mas passou ao lado dos momentos decisivos. Os artistas não encantaram o dérbi.

Não é costume, mas este duelo entre grandes foi decidido por jogadores teoricamente menos cotados. Figuras menores na constelação sportinguista e benfiquista: Jefferson, marcador improvável do 1-0 e autor de bela exibição, e Jardel, outro «goleador» imprevisto, do lado do Benfica.

Artur, depois de dias de sombra e dúvida sobre se teria condições para substituir Júlio César, acabou por mostrar que tecnicamente continua a ser um grande guarda-redes, assinando enorme defesa que impediu Carrillo de fazer o 1-0. No golo, ainda travou um primeiro remate e não tinha hipótese de chegar à recarga. E sim, acusou também dois momentos de menor concentração, mas nenhum deles comprometedor.

As defesas não «ganharam», mas também não perderam
 
«Nunca vi o Sporting com capacidade para nos fazer golo, mas também não vi o Benfica com muita capacidade para fazer golo (…) Tivemos a sabedoria e a sorte de saber posicionar os jogadores de forma a que uma segunda bola pudesse ressaltar para um jogador nosso»
JORGE JESUS, treinador do Benfica, após o dérbi de Alvalade
 
Um exemplo de uma exibição bem conseguida? William Carvalho. Jogou e fez jogar. Quase sempre certo no passe, a remeter para a melhor fase da época passada, a fazer esquecer o longo período de sombra que viveu nos últimos meses.

Outro caso de desempenho muito positivo? Paulo Oliveira. E Tobias Figueiredo quase tão bem. Bons sinais para o futuro leonino, mas cenário pouco provável para quem antecipasse um Sporting-Benfica há não muito tempo.

Nani, já se disse, passou ao lado do jogo. Mas também Salvio.  E mesmo Lima. E até Carrillo, se descontarmos aquele belo cabeceamento.

Ou seja: as defesas melhores que os ataques; quem precisava de anular o jogo contrário passou melhor durante o clássico do que quem teria arte para desfeitear o adversário.
 
Jorge Jesus argumentou, no final, que também há beleza «em defender bem»  e em saber interpretar o «momento defensivo». Uma ideia a remeter para tese que José Mourinho apresenta há muito: a de que «são as defesas que ganham campeonatos».

O empate premiou essa tal prioridade que o Benfica quis dar ao rigor defensivo, mas o campeão saiu de Alvalade com a sorte grande: a derrota esteve mesmo por breves momentos e implicaria a reentrada do Sporting na corrida ao título e um FC Porto que ficaria a meros três pontos.

Embora tendo jogado mais que o rival, o Sporting também não mostrou, na verdade, muito maior capacidade para chegar à baliza contrária. Mostrou atitude, alma, mas acusou falta de talento ofensivo para contrariar o tal «momento defensivo» preparado por Jesus.

O FC Porto mais perto e o Sp. Braga a espreitar o pódio

«Não entendo os que dizem que jogam em contra-ataque. Para jogar em contra-ataque é preciso espaço. Seria absurdo dizer que uma equipa não quer aproveitar espaços porque não joga em contra-ataque. A chave é saber o que fazer com a bola para que a posse não acabe num contra-ataque. Ninguém oferece espaço. É preciso trabalhá-lo. E quando o temos, temos de aproveitar»

JULEN LOPETEGUI, treinador do FC Porto, entrevista ao «El País»


Quem tirou mais créditos do duelo lisboeta foi, obviamente, o FC Porto.  A equipa de Lopetegui, depois de cumprir tranquilamente a sua obrigação em Moreira de Cónegos, tinha o Sporting a apenas um ponto e o Benfica a largos seis. Depois do dérbi, aproximou-se do Benfica e descolou dos leões. Difícil pedir mais, sem dúvida.

Herrera, com dois passes para golo, provou que ainda pode chegar perto, no FC Porto, do que rende na seleção mexicana. Mas o que fica, essencialmente, da vitória portista no reduto do Moreirense é o instinto matador de Jackson: um tiro, um golo. Um dos melhores pontas de lança do Mundo joga em Portugal, que ninguém duvide disso.

Os dragões ainda têm caminho para poder ultrapassar o Benfica -- e isso até pode nem obrigar a um triunfo na Luz. E fica a ideia de que, depois de quase um dia de dragão virtualmente «abatido» com a derrota na Madeira, o tropeção do Benfica em Paços pode ter servido de «ponto de viragem» (psicológico, pelo menos) para águias e dragões nessa luta que, depois do dérbi de Alvalade, parece cingida a dois.

E escrevi «parece» porque há sempre uma réstia de esperança para o Sporting na luta pelo título (pequena, é certo, porque necessita de anular sete pontos com o Benfica, ou oito caso não tenha melhor diferença de golos, e ainda três ao FC Porto).

No entanto, um olhar mais detalhado para a classificação mostra-nos outra coisa: o Sp. Braga, em clara curva ascendente (o triunfo claro no Estoril voltou a mostrá-lo), começa a sonhar não só com o quarto lugar (acabado de conquistar ao V. Guimarães), mas mesmo com o terceiro (está a seis pontos do Sporting).

Faltam 42 pontos em disputa, 14 jornadas a cumprir. O Benfica ainda recebe o FC Porto e o Sp. Braga e vai a Guimarães; os dragões, além de irem à Luz, ainda têm que ir a Braga e recebem Sporting e V. Guimarães.

Será importante perceber se, para o Benfica, nos meses finais da época, será vantajoso ou nem por isso ter ficado tão cedo fora das competições europeias. Até agora, esse dado não foi relevante, porque a Champions só volta para a semana e, portanto só aí o FC Porto passará a ter mais jogos nas pernas que o rival da Luz.

Tudo muito em aberto, portanto. E assim é que é bom.

«Nem de propósito» é uma rubrica de opinião e análise da autoria do jornalista Germano Almeida. Sobre futebol (português e internacional) e às vezes sobre outros temas. Hoje em dia, tudo tem a ver com tudo, não é o que dizem?