«4x4x3» é um espaço de análise técnico-tática do jornalista Nuno Travassos. Siga-o no Twitter.
José Mourinho nunca foi de consensos. Nem nos momentos de consagração, quanto mais nas ocasiões em que teve de fazer a mala. Daí que agora, que foi despedido pelo Manchester United, seja tão válido destacar os três títulos conquistados em dois anos e meio como o mau futebol praticado pelos «red devils» durante quase todo este período.
O técnico português foi quem mais honrou a herança de Sir Alex Ferguson no que aos títulos diz respeito, mas ainda assim ficou muito distante da exigência cultivada pelo mítico técnico escocês em Old Trafford. Mas neste período de natural reflexão, junto da família, Mourinho deve concentrar-se sobretudo naquela que é a sua herança: a do treinador que mais fez pelo futebol português.
Consumado o pior registo de vitórias desde que deixou Leiria, deve analisar a forma como se afastou do seu próprio legado.
A ideia que fica é que, ali entre 2010 e 2013, Mourinho deixou-se levar pelo lado mais submisso do jogo. A festa em Camp Nou, na antecâmara do título europeu conquistado pelo Inter, serviu de guia para depois, ao serviço do Real Madrid, encarar os duelos com o melhor Barcelona da história.
É verdade que esse sempre foi um dos principais trunfos de Mourinho - a capacidade para condicionar o adversário a partir de um estudo pormenorizado -, mas o técnico setubalense não se tornou especial só por isso. Elogiava-se também uma identidade bem vincada, que não estava dependente do opositor, e patente em todos os momentos do jogo. Em todos os lances do jogo.
José Mourinho foi reduzindo essa marca ao longo dos anos, também por culpa da forma como foi olhando para o mercado. Por ter deixado que, em alguns casos, a ambição de uns fosse dominada pelo conformismo de outros. E se antes o técnico português parecia escolher as lutas de egos a dedo, dada a forma como saía reforçado interna e externamente, os últimos anos têm revelado diferendos inultrapassáveis.
Esta pausa forçada permitirá também repensar a composição da equipa técnica e avaliar o impacto da saída de Rui Faria, braço direito durante quase duas décadas. É que nenhum treinador se torna especial se não estiver bem rodeado.
E Mourinho continua a ser especial. Precisa é de recuperar os passos que lhe deram esse estatuto. Que volte depressa. Aos bancos, e a esse caminho de sucesso.