Para Miguel Dias quarta-feira ia ser apenas quarta-feira, mais um dia da semana deste estudante de Arqueologia, em Lisboa. Um dia como outro qualquer, não fosse o At. Bilbao, do qual é adepto. Num desses tropeções da vida, encontrou a equipa basca. Começou por ficar de boca aberta, depois sem reação e acabou a colocar um sorriso em Bielsa, o primeiro que viu no treinador argentino. «El Loco» acedeu à «loucura» do jovem português. Percebeu que ali não estava «inimigo» e deixou-o ver o treino. Para Bielsa e para o At. Bilbao não foi muito. Para Miguel Dias foi quase tudo, como conta ao Maisfutebol.
A emoção ainda lhe percorre a voz, percebe-se. À primeira pergunta, Miguel Dias arranca e vai por ali fora. Fala no mesmo ritmo com que o pé esquerdo de Messi leva a bola desde o meio-campo até à linha de golo: «Foi uma situação caricata. Eu tinha de ir ao Estádio Universitário marcar um campo e não sabia onde era a secretaria. Andava ali a perguntar e, de repente, vejo uma pessoa com um fato de treino do At. Bilbao. "Este é o treinador de guarda-redes do Bilbao", disse para mim mesmo.»
Uma primeira pausa. Não no discurso do jovem de 20 anos, mas na cabeça deste próprio jornalista: «Quem é que em Portugal reconhece assim a cara do treinador de guarda-redes do At. Bilbao? Um "louco", só pode.» Mas como a história é de Miguel Dias, driblemos: «Achei que estava a ver mal. Mas não. Pensava que o treino era em Alvalade e estava a falar com outro senhor quando vejo o Marcelo Bielsa a vir na minha direção. Fiquei de boca aberta!»
E como vinha o treinador do Athletic? «Naquele jeito dele, olhos postos no chão, óculos na ponta do nariz com ar sério e pensativo». Miguel Dias conhece-o na perfeição, sem nunca o ter realmente conhecido. Até agora. «A minha reação foi um pouco estúpida. Disse-lhe: "Então Bielsa, estás fixe?" Ele riu-se. Foi a primeira vez que o vi a sorrir.»
O contacto foi curto. «Disse-lhe que era grande fã do At. Bilbao e dele também. Cumprimentou-me e disse-me que tinha de ir para o treino.» Bielsa lá foi. Mas não esqueceu. Num entretanto, Miguel Dias esfregou os olhos: «Vi o Muniain e o Ibai. Pensei que não podia fazer o mesmo e atirei-lhes uma saudação em basco: Eup! Eles devem ter perguntado "Quem é este?". Eu expliquei e eles foram para o treino.»
Nova pausa. Miguel Dias é de Felgueiras. De onde lhe vem esse amor pelo At. Bilbao? «Tinha aí uns sete anos quando comecei a ver notícias sobre a ETA, quis saber mais e pus-me a ler sobre o País Basco. Comecei a admirar a cultura», explica.
«O Bilbao aperta-me o coração»
E por fim conheceu a história do clube, que um dia foi Atlético por imposição do governo. «Foi sempre contra a opressão franquista. O Athletic tem uma história fabulosa. Para além disso, os jogadores sentem a camisola. O Etxeberria podia ter saído e sido um dos melhores do mundo, mas ficou.» Sentir a camisola... esse amor inocente que todos os adeptos têm e que tantas vezes não é retribuído. Para este português parece que é. Simplesmente porque é do Athletic.
Miguel Dias lá foi à secretaria. E voltou. «Perguntei ao segurança se não podia ver o treino. Disse-me que era à porta fechada, mas que tentasse na mesma. Quando olhei, Bielsa fez um sinal de que sim.»
Teve direito a 25 minutos. Saiu com uma foto e uma história para contar. «Sou português, mas há muitos anos que sou adepto do At. Bilbao. Fui habituado a ver o FC Porto vencer e também gosto do V. Guimarães, mas o clube que me aperta o coração é o At. Bilbao», garante.
Tanto assim é que tem bilhete para a final da Liga Europa. «Se o Sporting passar, vou na mesma e estarei incondicionalmente pelo Sporting, porque sou português. Agora, se o Bilbao for à final, vai ser dos melhores momentos da minha vida.» Será, portanto, uma "loucura".