Os manuais escolares do ensino básico incluem, desde 1995, publicidade «encapotada», mostrando marcas de refrigerantes, chocolates ou de materiais escolares nos livros de estudo, denunciou a socióloga Isabel Farinha no livro «Audiências Cativas» publicado terça-feira.

De acordo com o estudo «Audiências Cativas - as imagens-marca no manual escolar», a prática é frequente por exemplo em manuais de matemática, onde é pedido às crianças que somem figuras cujas imagens são latas de um determinado refrigerante ou ovos de chocolate de uma marca específica.

Segundo disse Isabel Farinha à agência Lusa, as marcas de fast-food, fast-drink e artigos de papelaria são as mais recorrentes.

O pai no sofá e a mãe a varrer

Para a autora esta problemática deve ser encarada numa «perspectiva de mercado» em que as crianças estão inseridas.

«Toda esta situação tem a ver com a sociedade de consumo e o poder das crianças em desencadear vendas», explicou, lembrando que as crianças «são um mercado 3 em 1, são elas próprias um mercado consumidor, um mercado influenciador do que as rodeiam (principalmente da família) e um mercado para o futuro».

Embora não proíba expressamente esta prática, o Código da Publicidade refere ser «vedado o uso de imagens subliminares ou outros meios dissimuladores que explorem a possibilidade de transmitir publicidade sem que os destinatários se apercebam da natureza publicitária da mensagem».

Contactado pela agência Lusa o secretário-geral do Instituto Civil da Auto-disciplina da Publicidade, Miguel Morais Vaz, escusou-se a adiantar se a publicidade nos manuais escolares constitui publicidade subliminar, mas lembrou que o mesmo artigo do Código da Publicidade considera como subliminar a publicidade que, «mediante o recurso a qualquer técnica, possa provocar no destinatário percepções sensoriais de que ele não chegue a tomar consciência».

A publicidade consumida pelas crianças tornou-se, entretanto, uma das preocupações do Governo que decidiu implantar, a partir de Fevereiro, o projecto Media Smart em escolas do 1º e 2º ciclo (para crianças entre os 6 e os 11 anos).

O projecto consiste em promover a literacia em publicidade baseado no ensino extracurricular de temas e conceitos relacionados com a comunicação comercial e não comercial de marcas e entidades.

Além disso, o Governo aprovou, em Maio do ano passado, um novo regulamento de avaliação, certificação e adopção dos manuais escolares do ensino básico e secundário onde esta questão já se encontra abrangida.

Apesar de a norma só entrar em vigor no próximo ano lectivo, o documento especifica que os manuais «não devem fazer referências a marcas comerciais de serviços e produtos que possam constituir forma de publicidade».