Um instante, uma precipitação e tudo muda. Até ao minuto 77, o Olhanense controlava o jogo na Mata Real e ganhava por um a zero. A expulsão de Tiago Targino, absolutamente escusada, precipitou a catástrofe e a reviravolta dos furiosos pacenses. Dois golos de Cícero, intercalados por escassos segundos, atiraram os algarvios borda fora na Taça de Portugal.

É fácil perceber que o ponta-de-lança do Paços de Ferreira foi o homem da tarde. Pressentiu o adversário ferido, em inferioridade numérica, e aplicou-lhe dois golpes irrecuperáveis. No primeiro cabeceou com êxito um centro arqueado de Paolo Hurtado e no segundo, mesmo a seguir, colocou toda a alma em mais um cabeceamento mortal. Desta vez a passe de Antunes.

Os níveis de desespero que se acumulavam nas barricadas nortenhas passaram, num esfregar de olhos, para o lado contrário. O Olhanense perdeu tudo num ápice, sem perceber bem como. Toda a fortuna ajuizadamente gerida ao longo de grande parte do encontro perdeu-se num ato irrefletido.

Foi como se um milionário tonto apostasse tudo num cavalo errado. Saiu de bolsos vazios e uma lição de moral para estudar no Algarve.

FICHA DE JOGO E AO MINUTO

É justo, porém, lembrar que essa tal fortuna, servida em jeito de golo, surgiu à custa da incapacidade de terceiros. O «frango» do guarda-redes António Filipe lembrou a todos os presentes que o titular se chama Cássio e estava no banco de suplentes.

O erro, clamoroso, foi devidamente aproveitado pelo somali-norueguês, Abdi de sua graça. Viu a bola ali estendida, largada por umas mãos trémulas e inseguras, deu dois passos e atirou para o golo olhanense.

Jogava-se há apenas 13 minutos e o número associado ao azar anunciou o período de desorientação do Paços de Ferreira. O Olhanense anulou a capacidade de André Leão iniciar os movimentos ofensivos, encurralou o cerebral Vítor num beco sem saída e sentiu-se profundamente confortável durante a esmagadora maioria do tempo.

Sérgio Conceição arrasa Targino e o árbitro

Até à expulsão do apocalipse algarvio, poucas notícias tivemos do ataque «castor». Um cabeceamento ameaçador de Ricardo, um pontapé bloqueado de Josué e um golo bem anulado a Cícero, por carga sobre Bracali na pequena área.

Sérgio Conceição, confiante, aproveitava para fazer estrear José Luís Fernandez, dar minutos a Evandro Brandão e jogar com a sofreguidão de um adversário de muito coração e pouca cabeça.

O técnico só não contava com a traição de Targino. Amarelado já há vários minutos, o extremo pontapeou a bola com o jogo interrompido e o árbitro fez o que devia. Expulsou-o. Dessa convulsão interna aproveitou-se Cícero, nome de filósofo e pensador romano, nome de herói para os lados de Paços de Ferreira.

Sem legiões ao seu dispor, nem um império disseminado por meio mundo, foi capaz de levar a equipa para a próxima ronda. Num instante. Não é pouco.