Old Trafford, 13 de abril de 2003. Canto na direita. Tonge faz a bola descrever um arco, com o efeito a afastá-la da pequena área. É uma bola parada estudada. O capitão Robert Page ganha nas alturas, fazendo pontaria ali para a frente do segundo poste. Asaba tenta o pontapé acrobático, mas acerta mal na bola, e aquela espécie de rosca é ainda assim o suficiente para ultrapassar Seaman. É Peschisolido quem parece beneficiar de toda a situação, a dois passos da linha de golo.
É só empurrar. O cabeceamento não sai tenso, vai ligeiramente em balão, mas o golo é inevitável. É naquela fracção de segundo em que os de Sheffield já imaginam a bola ao centro, e o empate a um golo feito, que o guarda-redes da bigodaça farta e do rabo de cavalo lança o braço atrás e tira-a de cima da linha. Um verdadeiro salvamento, um ato heróico. Do alto dos seus 39 anos, a cinco meses de ser quarentão, saca uma das grandes defesas da carreira. Provavelmente, a última.
É esta defesa incrível que garante ao Arsenal a final da Taça de Inglaterra. Antes, aos 34 minutos dessa meia-final jogada em Old Trafford, já Ljungberg tinha feito o primeiro, e depois desse voo de Seaman esse primeiro bastará.
«Fui feliz o suficiente para conseguir uma ou duas defesas importantes em penáltis na seleção, mas em jogo corrido essa foi provavelmente a melhor. Toda a gente diz que não sabe como consegui ainda tirar a bola a centímetros da linha, mas a verdade é que foi bem mais perto do que isso.»
Os Gunners têm agora a final em Cardiff frente ao Southampton, e Arsène Wenger, com Patrick Vieira lesionado, entrega a David Seaman a braçadeira de capitão. Se Ljungberg tinha marcado aos 34, Pires assina aos 38 o golo decisivo (1-0), e a festa é novamente do Arsenal.
Depois da festa, a saída. Após essa confirmação de keeper sólido, maduro e extremamente eficaz, de que estava na posse de todas as suas faculdades, diz adeus ao clube dos últimos 13 anos.
Seaman deixa o Arsenal no final da temporada e assina pelo Manchester City. Mas dura apenas mais seis meses. Uma lesão no ombro termina com a sua longa carreira. A defesa permanece como uma das melhores da história
Outras anatomias:
Peter Schmeichel, 26 anos depois de Gordon Banks
Bogdan Lobont: o romeno que se travestiu de Schmeichel em San Siro
A dupla-defesa impossível de Coupet em Camp Nou
San Casillas repete o milagre dois anos depois no Sánchez Pizjuán