Só há uma coisa melhor no futebol do que observar Ronaldo a jogar (ou Messi, pronto, ou até, no limite, Hugo Firmino nos tempos do Torrense): é encontrar um talento.
 
Olhar pela primeira vez para um craque que nasce, perceber uma maravilha que desabrocha. Descobri-la, mesmo que outros já a conheçam, e ficar arrebatados.
 
É enfim encontrarmo-nos encantados com a vertigem do futebol rebelde, e ao mesmo tempo habilidoso, de um jogador em crescimento. De uma criança, no fundo.
 
Até podem não dar nada no futuro, o caminho é geralmente longo e tortuoso. Podem tornar-se pigmeus furiosos de lágrima-puxa-risota e risota-puxa-birra, na definição de Miguel Esteves Cardoso que aproveito abusivamente
 
Mas o simples horizonte de possibilidades que uma promessa no estado original oferece já é suficientemente entusiasmante.
 
Por isso este artigo de hoje é sobre três talentos que eu, pelo menos eu, vou querer seguir no futuro: três jogadores das equipas B dos grandes que para já me encantam, para além dos nomes óbvios (para lá de Gonçalo Guedes, Gonçalo Paciência, Wallyson, João Teixeira, Kayembe ou Ryan Gauld).
 
Vamos a eles? Vamos lá então, que se faz tarde.
 
PITÉ (FC PORTO B)
Vou contar-lhe um segredo, leitor: vi a primeira vez Pité num jogo do Beira Mar com o Belenenses, para a Taça da Liga, e foi encanto à primeira vista.
 
É um daqueles esquerdinos que já não se fazem. Daqueles que não correm em campo, parece que dançam. Joga sempre de cabeça levantada, e isso diz tudo no fundo.
 
Todo ele é talento, mas é sobretudo um talento sedutor, fino e requintado.
 
É um esquerdino galanteador dos tempos antigos, que só conhece um tipo de futebol: o futebol atraente. De bola colada ao pé, gestos gentis e muita criatividade.
 
Uma lesão no início da época roubou-lhe algum tempo, mas mesmo assim tem jogado menos do que devia. Se o futebol moderno, porém, não tiver lugar para um talento elegante como Pité, então alguma coisa de muito errada se passa com o futebol moderno.

Veja este pormenor de Pité:



E já agora veja também este:


 
NUNO SANTOS (BENFICA B)
É também ele um esquerdino, mas é um esquerdino diametralmente oposto ao que é Pité. O que Pité tem em requinte, Nuno Santos tem em urgência, o que Pité tem em criatividade, Nuno Santos tem em faro de golo.
 
Jorge Jesus falou há tempos do nove e meio: um jogador que nem é nove, nem é dez. É no fundo um ponta de lança que recua no campo e constrói jogo.
 
Para mim, Nuno Santos, será um oito e meio: um extremo esquerdo, embora também jogue muito pela direita, com ares de avançado centro. É um talento apressado, um contrutor de golos inadiável, um jogador cheio de emergência para chegar à baliza.
 
É um extremo ao jeito de Stoichkov, salvaguardadas as devidas distâncias.
 
Um jogador com velocidade, remate forte e instinto goleador. Tudo nele é fúria, e urgência, e impetuosidade. Curiosamente foi formado no FC Porto, numa escola de atletas famosa pelo espírito combativo e lutador. Nuno Santos é porém mais do que isso, é um craque com técnica, com inteligência e sobretudo com muita impaciência.

Veja como joga Nuno Santos:


 
GELSON MARTINS (SPORTING B)
É o mais novo dos três jogadores, embora seja como Nuno Santos sénior de primeiro ano.
 
Já mereceu a chamada de Marco Silva à equipa principal, em dois jogos da Taça da Liga, cumprindo o desígnio da formação leonina: para o Sporting, Gelson Martins será o miúdo mais promissor das camadas jovens.
 
É um talento selvagem, na verdade: respeitando os genes cabo-verdianos, movimenta-se em toda a largura do campo sem freio, sem reservas e sem correntes.
 
Cai na direita, cai na esquerda, procura a bola no espaço vazio e acelera o jogo. Parece ter fogo nos pés, na forma desassombrada como cai em cima dos adversários, parte para o confronto direto e procura servir os companheiros na área.
 
É no fundo um exemplo acabado da escola leonina: um jogador sem limites de criatividade, sem medo de ir para cima do adversário e que joga de sorriso nos lábios. Como se estivesse numa peladinha de rua.

Veja o futebol de Gelson Martins:

 

Box-to-box» é um espaço de opinião de Sérgio Pereira, jornalista do Maisfutebol, que escreve aqui às sexta-feiras de quinze em quinze dias