«Temos de encontrar a melhor maneira de resolver este problema. Estamos bloqueados pelos regulamentos. Devíamos rasgar os contratos atuais e começar do zero.» (Bernie Ecclestone)

Em 2010, três novas equipas entraram para o grid da Fórmula 1. Hispania, depois HRT. Virgin, depois Marussia. Team Lotus, depois Caterham. Em comum a vontade de se cimentarem no campeonato e também o resultado final: fracasso.

A HRT acabou no final de 2012, quando era claramente a pior equipa. A Marussia acabou há semanas, depois de ser a única das novatas a conseguir pontuar, com o oitavo lugar de Jules Bianchi, o mesmo que agora luta pela vida depois do grave acidente em Suzuka, no GP do Mónaco. A Caterham sobrevive. Por um fio.

O problema é que há muito que a crise na Fórmula 1 deixou de ser uma exclusividade nas equipas mais recentes e não enquadrá-la devidamente pode ser catastrófico para a maior competição automóvel do mundo.

As equipas esbracejam por atenção, por mais dinheiro. Do alto do seu pedestal, Bernie Ecclestone parece alheado da realidade, a vários níveis. Esta semana, por exemplo, garantiu não precisar de público jovem na Fórmula 1. «Prefiro um velho rico de 70 anos, porque os jovens não compram nada e não sabem o que querem», explicou.

Renovação é palavra que não entra no vocabulário do «patrão» da F1.



Crise, porquê?

Falar em crise no cenário atual da Fórmula 1 já não causa surpresa. É, aliás, redundante. O cenário mundial de depressão teria de fazer sentir-se num desporto que gasta milhões e onde a distribuição de valores não é equitativa.

Ricos cada vez mais ricos, pobres cada vez mais pobres. A Fórmula 1 distribui prémios pelas equipas no final da temporada conforme os resultados atingidos, o que acaba por tornar-se um ciclo vicioso: se não há dinheiro para investir, não há resultados; se não há resultados não se ganha dinheiro para investir.

Recentemente, Max Mosley, antigo presidente da FIA, deu uma possível solução: distribuição igual de valores por todas as equipas. «A Ferrari vai sempre conseguir mais em patrocínios do que a Marussia, pelo que o prémio poderia ser o mesmo», justificou.

As equipas de topo, contudo, não estão pelos ajustes, o que tem dificultado ainda mais o cenário.

A Fórmula 1 possui um grupo de elite com as cinco principais equipas (Ferrari, Mercedes, Red Bull, McLaren e Williams), que não parece interessada em abrir hipóteses às outras candidatas. Equipas como a Force India, Lotus ou Sauber, para não falar das referidas novatas, lutam há anos por fazer-se ouvir. A crise também lhes bateu à porta. Desta equação, escapa apenas a Toro Rosso, satélite da Red Bull e, por isso, um caso diferente.

A crise na F1 está, assim, relacionada com os elevados custos de produção e desenvolvimento dos monolugares (é proibido comprar um monolugar a uma outra equipa e trabalhá-lo depois), a que se juntam os preços dos motores, que só as fabricantes Ferrari, Mercedes e Renault (mais a Honda em 2015) fornecem, a juntar à falta de igualdade na distribuição de fundos, o que aumenta a clivagem.

De lembrar que 2014 foi ano de estreia dos motores V6 Turbo, em substituição dos V8 aspirados que vigoravam até então. Ainda está por perceber se a medida, que tinha como objetivo ajudar na redução de despesas, surtiu o efeito pretendido, mas os primeiros indicadores contrariam a antevisão feita.

Soluções, há?

Nos últimos tempos, no universo Fórmula 1 o tema não varia muito: que solução para combater o cenário atual de depauperização crescente das equipas? Propostas existem, mas consenso não há.

Nos Grandes Prémios dos EUA e Brasil, a Fórmula 1 apresentou-se apenas com 18 monolugares em pista, face à dispensa de Marussia e Caterham. A primeira encerrou atividades, a segunda anunciou o regresso em Abu Dhabi, após uma ação de crowdfunding que ajudou a garantir uma quantia importante, mas ainda não é uma certeza em 2015.

A Haas Racing, nova equipa já assegurada, com base nos EUA, só chega em 2016, pelo que o cenário de haver apenas 18 carros em pista ainda assombra Ecclestone. O problema é que muitos dos contratos feitos com os promotores exigem 20 carros e é esse ponto que levou o dirigente máximo a bradar que o melhor mesmo era «rasgar o que existe e começar de novo».

Que soluções, então?

- Teto orçamental. Este é o ponto mais focado por parecer o mais lógico. A Ferrari é manifestamente contra por entender que limitaria o potencial de desenvolvimento das equipas, mas as menos ricas pedem, há muito, que haja limites para os gastos. Uma decisão deste tipo tem sempre de ser tomada por unanimidade, o que, tendo em conta que também a Mercedes não parece muito inclinada para aí, complica que se avance com este ponto que já ajudaria e muito a equilibrar a balança.

- Três carros por equipa. Solução avançada mal se tomou consciência que o grid estava a ficar demasiado reduzido. O tema divide opiniões, mas não parece ter pernas para andar porque um dos detratores é, precisamente, Bernie Ecclestone. Neste caso, as equipas que assim o desejassem poderiam ter um terceiro carro, que não contaria para o Mundial de Construtores, para não «obrigar» todas as escuderias a tê-lo. O problema detetado de forma mais frequente é a possibilidade de monopolização de pódios. Este ano, por exemplo, a diferença da Mercedes para as demais é tão evidente que se correria o risco que ver, variadíssimas vezes, um pódio 100 por cento da marca alemã, ao longo da época.

- Super GP2. A proposta surgiu nos últimos dias e visa, basicamente, tornar a Fórmula 1 numa espécie de MotoGP, com carros de duas categorias diferentes. Colocar em pista carros semelhantes aos da GP2 Series (categoria de formação), com motor melhorado e cujos resultados, a nível de Construtores, não teriam influência na luta dos gigantes.

- Distribuição equitativa de fundos. Seria a proposta que agradaria mais às chamadas equipas pequenas, mas poderia abalar as normas de competição. Ecclestone já admitiu que o dinheiro está a ser mal distribuído e encontrar um ponto de equilíbrio é a tarefa que as atuais nove equipas (contando com a Caterham e excluindo a satélite Toro Rosso) teriam de abraçar, sentadas à mesma mesa.

No próximo domingo, o Mundial 2014 termina em Abu Dhabi. Até lá, as atenções estarão no duelo Lewis Hamilton-Nico Rosberg, que vai decidir o sucessor de Sebastian Vettel como campeão do mundo. Depois da festa, será hora de voltar ao trabalho e perceber que futuro está a construir a Fórmula 1.

Para já, um dado parece certo: a crise atual é a maior das últimas décadas e pode mudar o figurino que o «Grande Circo» sempre ostentou. Nem que seja preciso, usando as palavras de Ecclestone, «começar tudo de novo».