Rigidez militar em casa, leviandade no campo de todos os sonhos. Submissão a regras draconianas entre quatro paredes, livre e agarrado às asas do futebol sempre que os pés tocavam uma bola.

Assim foi a meninice de Daniel Opare, reforço do FC Porto para 2013/14. A libertação, incondicional, levou-o de casa para a Academia do Ajax, na cidade de Kumasi, aos 11 anos. Depois, o talento fez o resto. E até Cristiano Ronaldo lhe deu uma ajuda.

Em Acra, capital do Gana, Opare prepara a entrada no Mundial. Ao mesmo tempo, celebra o contrato já assinado com o clube português. Tudo perfeito, tudo devidamente enquadrado na ambição dos 23 anos.

É este o lateral direito que o FC Porto precisa para despertar Danilo?

«Quero que as pessoas sintam que estou no jogo»

Se Maxwell Konadu estiver certo, os dragões «acertaram em cheio». Antigo avançado de Beira-Mar e União Leiria, Konadu é adjunto do selecionador do Gana e está em estágio com Daniel Opare.

À  Maisfutebol Total traça com entusiasmo o perfil do ex-Standard. «O Daniel Opare é um lateral muito rápido, muito ofensivo mas, ao mesmo tempo, taticamente disciplinado. É uma das figuras da seleção do Gana. É jovem mas é muito inteligente. Estou muito feliz que ele vá para Portugal», conta-nos .

As ideias estão provavelmente certas. Batem certo, pelo menos, com a auto-avaliação de Opare. Leia e compare:

«Gosto de ajudar o ataque, quero que as pessoas sintam que estou lá, quero participar e usufruir do jogo. Sou agressivo, determinado e, apesar de ser defesa, adoro marcar golos»,
anuncia à ETV, uma televisão ganesa .

Maxwell Konadu: «À esquerda safa-se, à direita brilha»


Quisemos mais e também ouvimos Dominique D’Onófrio. O italo-belga foi o primeiro técnico de Opare no Standard Liège. Os elogios às «características ofensivas» sucedem-se.

«Melhorou de época para época no Standard. É muito enérgico, veloz e brilhante nos cruzamentos. Esteve quatro anos na Bélgica, numa liga dura, e isso beneficiou-o muito: já defende melhor»
, considera o treinador.

«O meu pai não me queria deixar sair de casa»

«O meu pai era militar, estava sempre a saltar de cidade para cidade. Nós íamos com ele. Eu tinha 11 anos quando os observadores do Ajax me descobriram: puseram-nos a jogar futebol no meio de uma praça e duas horas depois chamaram-me: estás contratado!».

Em África o futebol de rua ainda estabelece regras. Separa os evidentemente talentosos dos apenas esforçados, traça muitas vezes a linha entre a fuga à pobreza e o clamor pela subsistência.

Daniel Opare tem a sorte, e a qualidade (lá está), de encontrar o caminho certo. Sai de casa e segue o sonho.



«O meu pai não me queria deixar ir porque eu era bom aluno na escola. Tinha só 11 anos. Ainda por cima, ele tinha o apoio dos meus professores»
, recorda Daniel.

E lá vai ele, de sacola na mão e as pernas escanzeladas. «Eu era tão pequeno que, quando me viram a primeira vez na academia do Ajax, pensaram que eu nunca poderia ser um verdadeiro jogador de futebol. Fiquei lá três anos».

A vida pisca-lhe o olho e Daniel deixa-se conquistar. Em 2007, o Mundial de sub17 faz o resto. Daniel Opare brilha, o Gana acaba em terceiro e um ano depois está no Real Madrid B.

É aí, de resto, que conhece Julen Lopetegui. O novo treinador do FC Porto nunca se esqueceu dele.

«O FC Porto pode estar descansado»

O processo de ida para o Real é, no mínimo, estrambólico. Opare tinha ido a Liverpool fazer testes e voltava a casa quando, no aeroporto, voltou para trás e entrou noutro avião.

«Fiz testes no Liverpool, pensei que ia ficar lá, mas dois senhores do Real Madrid pegaram em mim e levaram-me para Espanha. Amava o Real Madrid desde criança. Estava num sonho. Percebi que a vida me ia sorrir»
, conta Opare.

Um ano depois, em 2009, chega Cristiano Ronaldo. Daniel Opare treina durante quase toda a temporada com o internacional português.

«Deram-me um contrato de seis meses, mas um ano depois continuava lá e já treinava com os big boys. Ter o Ronaldo ao meu lado era incrível, dava-me uma moral fantástica. Nunca me intimidei. Aprendi muito com o Sérgio Ramos, retirei grandes ensinamentos para a minha carreira».



Em Madrid, porém, as verdadeiras oportunidades não surgem. E eis que surge o Standard Liège. Em boa hora.

116 jogos oficiais na Bélgica revelam andamento e competitividade. Aos 23 anos, Daniel Opare parece pronto para mais um teste duríssimo. Liberto das amarras disciplinares do pai e disponível para se continuar a entregar ao que mais ama.

«Diga às pessoas que gostam do FC Porto que podem estar descansadas. O FC Porto fez uma contratação muito, muito boa»,
resume Maxwell Konadu, técnico de Opare na seleção, à  Maisfutebol Total.


«Sei que o Daniel vai ter muito sucesso no Porto. Tinha outras hipóteses mas escolheu o FC Porto porque sabe que é um clube grande em Portugal e na Europa. A relação tem tudo para dar certo».