O que se está a viver é um «percalço financeiro», admitem alguns analistas ouvidos pela agência «Lusa».

Para o director da Schroders em Portugal, Leonardo Mathias, os fundamentais da economia europeia continuam «bem e estáveis», com as empresas a apresentaram resultados positivos, em linha com o esperado, pelo que não parece existir uma «crise económica», mas sim um «percalço financeiro».

No início do ano sabia-se que existia o problema do risco de crédito imobiliário «subprime» (tipo de empréstimo onde a possibilidade de incumprimento era mais elevada por ter sido concedido a devedores de mais baixos rendimentos), mas ele estava «perfeitamente contido nos Estados Unidos», afirmou Leonardo Mathias.

No entanto, com a proliferação da banca de investimento, o problema começou a espalhar-se por todo o mundo, acrescentou o director da Schroders, tendo demorado alguns meses até gerar alguma agitação forte nos mercados.

Nos últimos dias, com o aparecimento de cada vez mais notícias de dificuldades em instituições financeiras expostas a este tipo de produtos, as bolsas europeias ressentiram-se, com quedas à volta de dois por cento, que hoje estão a repetir-se nas principais bolsas internacionais.

«Todos os dias há mais uma novidade», lembrou Leonardo Mathias, e desde Julho é possível que esteja a haver alguma contaminação às bolsas, mas é preciso esperar mais algum tempo para o saber.

José Miguel Queimado, economista que está recentemente a tirar um mestrado em economia política em Georgetown, nos EUA, disse à «Lusa» que as intervenções recentes no mercado monetário por parte do Banco Central Europeu (BCE) são um sinal de que se está perante um «problema de liquidez» e não perante um «problema económico».

O volume das intervenções do BCE (95 mil milhões de euros na quinta-feira e hoje 61 mil milhões de euros) mostra também que «é uma certeza que vão aparecer mais bancos com problemas em produtos estruturados investidos neste tipo de crédito de risco elevado», segundo o mesmo economista, já que «todos os bancos de investimento na Europa têm este tipo de produtos nas suas carteiras».

A intenção do BCE parece ser a de prevenir que o problema de liquidez se alastre, actuando preventivamente e não reactivamente, acrescentou.

No entanto, José Miguel Queimado admite que o mercado possa ter ficado mais preocupado depois de ter visto o BCE entrar fortemente no mercado monetário, começando o suspeitar que os problemas conhecidos sejam apenas «a ponta do iceberg».

Desde o início do ano que começaram a surgir fundos e empresas norte-americanas com problemas no incumprimento do crédito imobiliário de alto risco, sobretudo relativo a pessoas de baixos rendimentos que, antes das taxas de juro terem baixado nos EUA, não tinham acesso ao crédito.

Algumas faliram e as pessoas começam agora a perceber, segundo José Miguel Queimado, que alguns dos títulos que tinham sido vendidos (com a cedência dos créditos a entidades terceiras), sobretudo através de produtos estruturados, não seriam recuperados.

As bolsas mundiais só no início de Julho começaram a ficar mais agitadas, lembrou Leonardo Mathias, com os investidores a mostrarem algum receio de que as complicações no incumprimento acarretem consequências para o resto da economia dos EUA e se espalhem a outros países.

Outro analista de mercado ouvido pela «Lusa», que pediu o anonimato, também admite que está a haver algum «pânico» nos mercados bolsistas e monetário e que não há dados económicos que confirmem o alastramento da crise hipotecária ao resto da economia.