«4x4x3» é um espaço de análise técnico-tática do jornalista Nuno Travassos.  Siga-o no Twitter.         

Com cinco pontos reduzidos na distância para a liderança da Liga, no espaço de um mês, o Benfica conseguiu uma recuperação naturalmente associada a escorregadelas alheias, mas que atesta também a evolução que a equipa tem registo nos últimos meses, certificada pela série atual de oito triunfos consecutivos.
 
Depois de um início atribulado, com Rui Vitória a tentar conciliar ideias próprias e uma herança pesada, as «águias» parecem agora consolidar processos. Esta é uma evolução imensurável, mas muito sustentada nas melhorias ao nível do jogo interior. O Benfica tem sido muito mais astuto a entrar no bloco defensivo adversário, bem menos dependente da qualidade individual de Jonas, o que em nada belisca a influência do avançado brasileiro (como se tem visto).
 
Esta evolução do Benfica no corredor central está associada essencialmente a dois nomes: Renato Sanches e Pizzi.
 
O primeiro tem apenas 18 anos, convém lembrar, e dizer que tem um potencial tremendo é isso mesmo...dizer que tem um potencial tremendo. Não se tornou entretanto o melhor médio do mundo, nem tão pouco o melhor português. Ainda tem muito para errar, é natural que o rendimento oscile, mas a influência na equipa é inequívoca. E mais do que o «pulmão» ou a agressividade, é a coragem que o valoriza. A recusa em largar a bola com leviandade, a audácia no passe.
 
No lance abaixo apresentado, Renato recebe um passe de Samaris junto ao círculo central, de costas para o ataque, e com dois adversários relativamente próximos.


 
Muitos jogadores optariam, neste cenário, por atrasar a bola para o central (no caso Jardel), ou por um passe lateralizado para o jogador que está a abrir na direita (Lisandro). O que fez Renato?


 
Virou-se «para o jogo». É essa a opção primordial, mesmo quando tem um adversário a soprar-lhe nas costas. E fá-lo porque tem capacidade técnica para tal, mas acima de tudo por saber sempre o que está a acontecer à sua volta. Mesmo antes de receber a bola. E depois está sempre disponível para arriscar no passe. Também falha, como é óbvio, por vezes até renunciando a uma linha de passe mais óbvia, mas a equipa precisa desse risco que é mais benéfico do que prejudicial. São mais os passes de Renato que desequilibram o adversário do que aqueles que desequilibram a equipa.
 
E se Renato Sanches lança as bases desse desequilíbrio positivo – aquele que é provocado ao adversário -, Pizzi tem sido o elemento que o desenvolve. Não está na direita, mas também não está propriamente ao centro. Não está bem a meio-campo, mas também não está no ataque.



É a tal «terra de ninguém» que não basta descobrir, é preciso explorar. Não há tempo para hesitar. O desequilíbrio está encontrado, é preciso avançar. Decidir rápido, decidir bem. Por mais reduzido que seja o espaço, por mais curto que seja o tempo. E Pizzi, tal como João Mário no Sporting
, sabe fazê-lo.


 
As melhorias no jogo interior do Benfica têm outras explicações, como a crescente ligação entre os dois avançados (apesar de terem feito faísca no 3º golo ao Arouca). Jonas continua a explorar inteligentemente o espaço entre linhas, mas agora surge mais frequentemente em linha com o parceiro de ataque. Até para não chocar com Pizzi. A ideia é multiplicar opções de passe, e não sobrepô-las.


 
O Benfica tem ainda espaço para crescer, até pelo regresso de Nico Gaitán, mas o salto qualitativo que deu nas últimas semanas já permitiu relançar a candidatura à revalidação do título. Uma evolução muito associada a Renato Sanches e a Pizzi, mas que justifica também elogios a Rui Vitória, que soube fazer o diagnóstico e encontrar o tratamento adequado.