200 jogos. Titular, jogou mesmo até ao fim. E marcou sobre os descontos o golo que transformou em vitória um jogo muito difícil para Portugal. Cristiano Ronaldo já só compete consigo próprio quando se fala em recordes de longevidade com a camisola das seleções. E ainda assim, insiste. 

Em agosto passarão 20 anos desde que esta história começou. Desde aquele dia em Chaves, quando saiu do banco frente ao Cazaquistão, Cristiano Ronaldo escreveu uma história que ninguém poderia imaginar. Foi capitão nas únicas conquistas da seleção, o Euro 2016 e a Liga das Nações, foi sempre protagonista. Aos 38 anos, ele diz que nunca dirá adeus à seleção, uma história que fez sua ao longo de duas décadas. Com altos e baixos, com golos que nunca mais acabam. São 123, para já.

Esta é uma viagem por dez dos momentos mais marcantes deste percurso inigualável.

O primeiro golo e a lenda que nasceu no Dragão

A história começou a 20 de agosto de 2003 em Chaves, quando Figo saiu ao intervalo do particular entre Portugal e Cazaquistão e para a segunda parte entrou em campo o miúdo de 18 anos e meio que tinha acabado de trocar o Sporting pelo Manchester United. Mas o primeiro capítulo para a lenda de Cristiano Ronaldo aconteceu no Estádio do Dragão, a 12 de junho de 2004. Portugal engalanou-se para receber o Euro 2004, mas a estreia foi um balde de água fria – havia de piorar, com a repetição do filme na final. No jogo inaugural, os golos de Karagounis e Basinas gelaram o país, mas da sombra saiu uma luz. Já se jogavam os descontos quando Cristiano Ronaldo, que tinha entrado para a segunda parte a render Simão, apareceu na área a cabecear para golo num canto batido por Figo. À oitava internacionalização, era o primeiro de todos os golos com a camisola de Portugal para o jovem extremo, como lhe chamava o Maisfutebol no relato ao minuto do jogo. Ainda foi suplente no jogo seguinte, com a Rússia, mas a partir daí ganhou o lugar. Até às lágrimas na final perdida para a Grécia. Até hoje, 19 anos depois.

Mundial 2006, o miúdo a jogar como gente grande e aquela piscadela

Cristiano Ronaldo foi ganhando protagonismo com a seleção na caminhada para o Mundial 2006, marcada pelos históricos 7-1 à Rússia, com um bis dele. Na Alemanha, marcou de penálti frente ao Irão o seu primeiro golo em Mundiais, mas há muito mais para recordar naquela que foi a competição da sua afirmação nos grandes palcos. Entre todos os momentos, o Portugal-Inglaterra. Antes de Ricardo voltar a ser herói nos penáltis, Ronaldo fez-se líder e protagonista e pôs o mundo a falar dele, pela exibição mas também por aquela piscadela quando saiu o vermelho para Rooney, seu companheiro de equipa no Manchester United.

O ketchup e o amargo Mundial 2010, «assim não»

Scolari saiu, chegou Carlos Queiroz, a caminhada para a África do Sul foi sofrida e marcada também pela seca de golos de Cristiano Ronaldo. Foram 16 meses sem marcar na seleção, o seu mais longo jejum. Ele disse que era como o ketchup, quando voltasse a marcar eles iam sair em jorro, mas na verdade despediu-se do Mundial 2010 com apenas um golo, na goleada à Coreia do Sul. E no meio de um ambiente pesado, bem expresso na eliminação frente à Espanha nos oitavos. O «Assim não, Carlos» que Ronaldo soltou, a reagir à substituição de Hugo Almeida por Danny, sela um Campeonato do Mundo de má memória para ele e para Portugal.

Do melhor golo que não valeu ao Euro 2012

Ao terceiro Europeu, Ronaldo voltou a liderar Portugal numa campanha que só terminou na meia-final, perdida de novo para a Espanha, agora nos penáltis. Pelo meio, a seleção até tinha conseguido uma goleada histórica frente à Roja, aquele 4-0 num particular em novembro de 2010 em que Cristiano Ronaldo ficou em branco, mas só porque Nani se meteu no caminho e invalidou aquele que seria um dos grandes golos da sua carreira. Na fase final do Europeu, Cristiano apareceu em estilo ao terceiro jogo, quando Portugal precisava de vencer os Países Baixos para se apurar. Marcou os dois golos da vitória. E ainda foi dele o golo que decidiu os quartos de final, frente à República Checa.

O melhor golo de Cristiano que não valeu

E o bis aos Países Baixos no Euro 2012

À frente de Eusébio com o primeiro hat-trick

Por esta altura, Cristiano Ronaldo já estava lançado para bater todos os recordes. Em outubro de 2012 somou a 100ª internacionalização, apenas o terceiro português depois de Fernando Couto e Figo a consegui-lo e o mais jovem, aos 27 anos. Menos de um ano mais tarde, atingiu em estilo outro marco histórico. Em Belfast, Portugal perdia com a Irlanda do Norte na corrida ao Mundial 2014 quando apareceu Ronaldo. Em 15 minutos fez um «hat-trick», o primeiro com a camisola da seleção, fechou o resultado em 4-2 e de caminho superou os 41 golos de Eusébio pela seleção. Seis meses mais tarde, em março de 2014, ultrapassava com um bis frente aos Camarões os 47 golos de Pauleta e tornava-se o melhor marcador de sempre pela seleção.

Solna para a lenda

É provavelmente o momento dos momentos de Cristiano com a camisola de Portugal. Começou na Luz, com o golo que levou a seleção em vantagem para a segunda mão do play-off do Mundial 2014, com a Suécia. Em Solna, naquele que era antecipado como um duelo de gigantes com Ibrahimovic, Cristiano vestiu a capa de super-herói. Um golo, mais outro e mais outro. Aquela exibição que pôs Portugal no Mundial até levou a FIFA a alargar o prazo da votação para a Bola de Ouro. E ele ganhou-a nesse ano, tal como no ano seguinte. O Mundial, esse, foi para esquecer. Ronaldo estava com limitações físicas e passou, ele e a seleção, quase incógnito pelo Brasil. Despediu-se com um golo frente ao Gana, na eliminação na fase de grupos.

 O drama até à festa em Paris

A história teve finalmente um final feliz, mas o caminho foi tortuoso. No Euro 2016, Cristiano começou por se tornar o mais internacional de sempre por Portugal – superou Figo ao segundo jogo, no empate com a Áustria em que falhou um penálti. Depois, marcou dois golos no 3-3 com a Hungria que apurou Portugal no limite. Voltou a ser ele a mostrar o caminho com o primeiro golo na meia-final, frente a Gales. E depois chegou 10 de julho, no Stade de France. A final em que Portugal perdeu Cristiano, que se lesionou logo aos oito minutos e ainda tentou continuar, mas acabou mesmo por sair. Enquanto Portugal cerrava fileiras, de Cristiano ficam as lágrimas a abandonar o campo e, já depois do golo de Eder, os minutos finais junto à linha, a atropelar-se com Fernando Santos enquanto gritavam ambos lá para dentro, antes da explosão de alegria quando acabou, finalmente. Campeões da Europa.

A máquina goleadora e aquele jogo com a Espanha

Na campanha para o Mundial 2018, Cristiano Ronaldo foi demolidor. Marcou 15 golos em nove jogos e chegou à Rússia disposto a deixar de novo a sua marca. E fez do jogo de abertura, frente à Espanha, um espectáculo de gala. O «hat-trick» naquele empate a três golos, selado com a melhor versão do seu livre emblemático, é outro dos momentos para a lenda de Cristiano. Voltou a decidir o jogo seguinte, quando marcou o golo da vitória sobre Marrocos, mas a história não foi muito mais longe. Portugal caiu logo nos oitavos, frente ao Uruguai.

História e mais história, do Euro 2020 ao recorde de golos

A uma pausa na seleção depois do Mundial 2018, a coincidir com a mudança para a Juventus, seguiu-se para Cristiano e para Portugal a conquista da Liga das Nações, com um hat-trick do capitão na meia-final frente aos Países Baixos. Dois anos depois, com a pandemia pelo meio, chegou o Euro 2020, o campeonato de todos os recordes para o 7 português. Foi o primeiro de sempre a jogar cinco fases finais da competição, passou a ser o jogador com mais jogos e mais golos em fases finais. Foram cinco só no Euro 2020, todos na fase de grupos, antes da eliminação frente à Bélgica nos oitavos de final. Logo em setembro, outro recorde. Com o bis à Irlanda, superou o iraniano Ali Daei e tornou-se o melhor marcador da história em jogos de seleções. Chegava então aos 111 golos.

O banco no Qatar antes dos 200 jogos

Cristiano Ronaldo chegou ao Mundial 2022 depois de entrar em rutura com o Manchester United. Fez história no Qatar, sim, logo na estreia frente ao Gana, quando se tornou o primeiro jogador de sempre a marcar em cinco fases finais do Campeonato do Mundo. Mas a imagem que fica é a do dia em que foi para o banco de suplentes. Depois da rábula do diz que disse para Fernando Santos na substituição frente à Coreia do Sul, ficou fora do onze titular nos oitavos de final com a Suíça, quando Portugal arrancou para uma das melhores exibições em muitos anos, selada com uma vitória por 6-1. Voltou a ser suplente no jogo seguinte, a eliminação frente a Marrocos. Depois da passagem amarga pelo Qatar, depois da mudança para a Arábia Saudita, depois da mudança de selecionador, continuou na seleção. Aos 38 anos, já longe do seu melhor, acabou por deixar Inglaterra e o futebol europeu. Mas diz que nunca irá abdicar da seleção e ainda quer ir ao Euro 2024. Foi titular nos quatro jogos com Roberto Martínez no banco e marcou cinco golos. Entre eles aquele que, ao cair do pano, garantiu a vitória sobre a Islândia, no dia em que atingiu esta marca inacreditável. 200 jogos com a camisola de Portugal.