Três anos depois, Rúben Amorim volta a ser o arquiteto e a figura número um da conquista do Sporting. Mas desta vez nasceu outra estrela em Alvalade: Viktor Gyökeres, o super herói de máscara.

Numa época em que investiu como nunca em reforços escolhidos a dedo para as posições identificadas como carentes, o Sporting ganhou ouro em troca do recorde de 20 milhões como base da contratação do avançado sueco, que chamou a si os holofotes desde os primeiros minutos da época.

Mas houve mais protagonistas, diferentes jogadores importantes em diferentes momentos da temporada, em função da gestão das necessidades da equipa ou das baixas forçadas, por lesões ou por ausências como as de Morita, Diomande e Catamo, o herói do dérbi, que a meio da temporada passaram um mês com as suas seleções na Taça da Ásia e da CAN. Houve até a troca de guarda-redes a meio do caminho.

Essa gestão foi uma das chaves da época do leão, que teve 26 jogadores em campo na temporada que termina em festa, desta vez junto dos adeptos, depois do título de 2021 em plena pandemia. Estes são os principais protagonistas.

1. A melhor obra de Amorim

Este Sporting é uma vez mais a cara dele e foi talvez a sua melhor obra em Alvalade. Rúben Amorim também já falhou, o que dá ainda mais valor ao que fez este ano. Foi a partir do ponto baixo que representou o quarto lugar da época passada que construiu uma equipa melhor, mais versátil, com mais qualidade e profundidade. Começou a ganhar a época com a escolha criteriosa dos reforços, apoiado pela liderança do clube na opção por apostas que representaram um investimento recorde e foram ganhas a toda a linha, com a exceção de Fresneda.

A liderança serena mesmo nos momentos mais complicados, a empatia no balneário e na sala de imprensa, o discurso frontal e desempoeirado, tudo isso Rúben Amorim sublimou este ano. Tanto que chegou à reta final da época apontado a outros voos e isso, não restam dúvidas, mexeu com ele. Mesmo quando errou - e aquela viagem extemporânea a Inglaterra na fase decisiva da luta pelo título foi um enorme tiro no pé -, Amorim distinguiu-se pela honestidade na forma como aborda as questões. Termina a época bicampeão e disse que se sentia perdido em relação ao que virá. Se o futuro de Rúben Amorim é incerto, mais ainda será o do Sporting, se perder o treinador que ao longo destes quatro anos e meio construiu algo de muito especial em Alvalade.

2. Gyökeres, o homem da máscara de ouro

O Sporting descobriu ouro no Championship, gastou mais do que nunca para o garantir e Gyökeres abriu um mundo novo ao leão, trazendo tudo aquilo de que Amorim precisava para tornar mais versátil o jogo do Sporting. A potência, a intensidade, a frieza, a voracidade, a capacidade de provocar desequilíbrios, a disponibilidade permanente e o instinto finalizador do Panzer sueco definiram este campeonato.

Ao fim de 15 minutos em campo e dos dois golos logo na primeira jornada estava apresentado o homem da máscara. Tornou-se viral o festejo, estavam desde logo seduzidos os adeptos do Sporting. Chega à reta final da época com 27 golos na Liga mais nove assistências, 41 golos no total da temporada e ainda não acabou. Para lá dos números, foi o jogador mais influente do campeonato, pelo que acrescentou à equipa mesmo quando não marcou. Bastou uma época para Gyökeres entrar na galeria dos grandes avançados que o futebol nacional já viu.

3. Pote, rendimento garantido

Os anos passam e Pedro Gonçalves continua a ser a constante de talento e disponibilidade em Alvalade. O melhor marcador da Liga na caminhada até ao título em 2020/21, na estreia de leão ao peito, foi menos exuberante nas duas temporadas que se seguiram, é certo, mas não deixou de ser essa referência.

Na caminhada para o seu segundo título de leão ao peito em quatro épocas, o rasgo e a imprevisibilidade de Pedro Gonçalves foram de novo rendimento garantido. É o jogador da Liga com mais assistências, a que juntou até agora 11 golos no campeonato e 18 no total de uma época em que voltou a dizer presente, seja em que posição for. Mais uma temporada que alimentou o sonho adiado da seleção nacional, destruído de forma cruel na lesão frente à Atalanta na véspera da última convocatória antes do Euro 2024.

4. Paulinho, agora o bem-amado

Com a chegada de Gyökeres, Paulinho deixou de ser a principal referência do ataque do Sporting. Mas acaba a época com o melhor registo goleador das suas três temporadas e meia em Alvalade – 19 golos, 13 deles na Liga. A presença do sueco foi também um fator multiplicador de espaços, que ajudou a libertar o internacional português. Tantas vezes mal-amado, sob o peso do investimento da sua contratação ao Sp. Braga, o avançado soltou-se também dessa pressão.

A jogar de início ou a sair do banco, à esquerda ou ao centro, Paulinho foi na verdade o avançado com melhor eficácia e o homem dos golos decisivos – na jornada inaugural em Vizela, seguida do bis ao Casa Pia e do triunfo sobre o Famalicão, mais tarde ainda na reviravolta frente ao Estrela, no calcanhar para a vitória em Portimão ou, por fim na grande exibição frente aos algarvios em Alvalade que deixou o Sporting à beira da festa. Já tinha sido ele a marcar o golo que valeu o título em 2021, quem se lembra?

5. Hjulmand, o pêndulo que veio do frio com escola italiana

Outra aposta forte vinda do frio, outro investimento com retorno imediato. A herança de referências como Palhinha e Ugarte era pesada, mas o médio dinamarquês com escola italiana foi tudo o que o Sporting pedia. Um pêndulo de intensidade, cérebro e clarividência a desarmar, a equilibrar e a construir, foi uma peça chave na caminhada até ao título.

Com Hjulmand, o Sporting ganhou também liderança e atitude. Chamam-lhe garra, o espírito que mobiliza do campo às bancadas. O médio que joga no limite tornou-se rapidamente protagonista, na época em que, além do mais, beneficiou do enquadramento no Sporting para ganhar maior influência a nível ofensivo. Leva quatro golos esta época, ele que em toda a carreira só tinha marcado um.

6. Coates, o capitão de sempre

Aos 33 anos, Coates foi igual a si mesmo na oitava época em Alvalade. O que é dizer muito do capitão que se tornou nesta temporada o estrangeiro com mais jogos pelo Sporting, o sétimo em absoluto e também o defesa mais goleador da história dos leões.

São até aqui 366 jogos e 37 golos no total, 41 partidas nesta temporada e quatro golos na Liga para o capitão sereno, que lidera pelo exemplo. O bombeiro que tanto salva a equipa lá atrás como vai para a frente quando é preciso. Foi dele o golo que evitou o mal maior no empate em Vila do Conde, foi ele que sacudiu tantas e tantas vezes o perigo na área. Os anos passam, a sua influência tenderá a diminuir, mas a identidade deste Sporting continua a dever muito à experiência e ao exemplo do capitão, já com a renovação assegurada.

7. Geny Catamo, o herói improvável

Quando daqui por muitos anos alguém se puser a recordar este campeonato, o dérbi de Geny Catamo estará seguramente entre as primeiras memórias. São momentos como aquele que fazem a história e escrevem as lendas. Um golo a abrir e outro a fechar, o herói improvável que sentenciou simbolicamente o campeonato.

Foi obra dele, do miúdo que saiu de Moçambique para jogar no Amora, que chegou ao Sporting e saiu para rodar em Guimarães e na Madeira, antes de voltar, pronto para crescer e aproveitar as oportunidades que o futuro traria. A época de Geny Catamo foi mais do que o dérbi, foi uma época de confirmação do potencial do internacional moçambicano que, mesmo numa temporada cortada a meio pela presença na CAN, se foi afirmando como opção preferencial para a ala direita.

8. Trincão, uma explosão de confiança

O Francisco Trincão que pareceu acusar tantas vezes o peso da pressão que o persegue desde a transferência precoce para o Barcelona deu lugar esta época a um jogador renovado. O talento sempre esteve lá, agora Trincão juntou-lhe consistência mas, sobretudo, confiança.

O maior exemplo, mas não o único, de um jogador que Rúben Amorim apoiou e protegeu mesmo em momentos difíceis, acreditando que era possível Trincão alcançar o seu potencial em Alvalade. Ele respondeu, cresceu em foco e voluntarismo, na capacidade de desequilíbrio e na qualidade de finalização, até à explosão no dobrar do ano, que se traduziu em cinco jornadas consecutivas a marcar. Com nove golos e seis assistências na Liga até aqui, foi talvez o jogador que mais cresceu esta época.

9. Bragança, a promessa a crescer

A época mais feliz do menino que veste de verde e branco desde sempre. Depois da grave lesão que o afastou dos relvados durante uma temporada inteira, Daniel Bragança voltou para fazer a sua temporada mais consistente em Alvalade.

Fez 44 jogos até agora, 24 deles na Liga, foi crescendo em confiança e influência. «Até parece maior dentro do campo», disse a certa altura Amorim sobre o médio que, na lógica de rotação do treinador, foi o exemplo perfeito de uma segunda vaga de qualidade, capaz de dar ao jogo aquilo de que ele precisa em cada momento. Cresceu e foi calando, aos poucos, a velha crítica de que lhe falta intensidade, como se alguma equipa não tivesse a ganhar com a visão e o requinte de um jogador como ele.

10. Gonçalo Inácio, a certeza de trás para a frente

A maior certeza da defesa leonina. O defesa mais utilizado por Rúben Amorim, Inácio já deixou há muito de ser uma promessa e é fácil esquecermo-nos que tem apenas 22 anos. Na quarta época em Alvalade, soma para já 46 jogos e quatro golos, a um do seu melhor registo.

Mesmo com dores de crescimento como a expulsão na Luz, foi a garantia de qualidade de sempre, o defesa que joga com bola, rompe linhas e descobre passas, as características que lhe vão valendo também a afirmação crescente na seleção.