Ao escrever o título desta crónica coloquei-me a jeito para um rol de insultos, de palhaço para cima, mas acredito na inteligência do leitor. De quase todos. Era uma pergunta retórica.

Neste ponto, totalmente de acordo com Leonardo Jardim: «Os consumidores de futebol são inteligentes. Não vale a pena escamotear o que as pessoas veem. Da mesma forma que não posso dizer que a equipa jogou bem quando jogou mal. Temos de ter algum cuidado com o que dizemos.»

Não utilizaria o termo «consumidores», porque penso imediatamente em filas de supermercado, descontos em cartão (bem sei que já há bilhetes para jogos a entrar nesta lógica, lamentavelmente) e um produto a aproximar-se do seu prazo de validade.

Quando um dirigente ou um treinador cospe no prato em que come, contribui para a desvalorização progressiva do produto. Leva alguns adeptos na cantiga e outros deixam de aparecer no estádio.

Neste lote estão os que acreditam na lógica e desistem, afastam-se no futebol. Estão ainda os que conseguem ver para lá da cortina de fundo e percebem que, não obstante um erro de arbitragem, a favor ou contra, a sua equipa não jogou nada.

Esses sabem discutir questões táticas, opções, picos de forma. Se o Benfica não venceu o Belenenses devido a um golo polémico, conseguem perceber igualmente que os encarnados tinham tempo e qualidade para reverter a situação. Se o FC Porto venceu o V. Guimarães com um golo polémico, não abafou por completo uma exibição sofrível na segunda metade.

Não esqueço que Jorge Jesus, na época passada, disse aos jornalistas que não estava ali para debater questões táticas com eles. E que, após os incidentes de Guimarães, disse aos mesmos jornalistas para debater a tática e não os lamentáveis incidentes. Quero acreditar que passará então a explicar as suas opções sem complexos.

Não esqueço que Paulo Fonseca sabia tudo sobre o penalty mal assinalado a Otamendi no Coimbra da Mota, minutos após o final do jogo, mas não teve tempo para rever e analisar o penalty assinalado na receção ao V. Guimarães. Quero acreditar que já o terá feito e ainda irá falar sobre o assunto.

Lidamos com isto e mantemos a esperança quando vemos Marco Silva, após um insulto captado pelas câmaras televisivas, a ter humildade para se retratar. Humildade e liberdade, porque nem sempre o treinador diz o que quer, quando quer.

Leonardo Jardim mantém-se à margem, não estraga o produto. Os resultados ajudam. Os adeptos, os consumidores, agradecem. E aparecem.

Se tiver dúvidas sobre a sua capacidade para ver para lá da cortina de fumo, aqui fica um teste rápido. Responda a estas perguntas e tire as suas conclusões:

1. Ainda há algum árbitro que seja nomeado para o jogo da sua equipa e que não provoque em si raiva imediata, que não o leve logo a pensar no golo roubado há três anos, oito dias e quatro horas?
2. Sabe ao certo qual foi o último onze de Benfica ou F.C. Porto na Liga, ou lembra-se apenas dos lances polémicos?
3. Por vezes pensa que os dirigentes e treinadores estão a sacudir água do capote, ou alinha em tudo, o mal está todo do outro lado?
4. Já conhece nomes como Ramón Cardozo, Maazou e Derley, ou para si o futebol português limita-se ao clube do seu coração e ao principal rival?
5. Se o seu clube jogar mal e o rival fizer ainda pior, fica satisfeito?