Ora, vamos lá. Capacete: check! Escudo: check! Colete à prova de balas: check!. Acho que já posso dizer isto: perdi a paciência para o FM.

Eu, que passei noites em claro a pensar como encaixar o Bakayoko, o Guti e o Caminero no meio campo do Atlético de Madrid; que festejei aos saltos quando consegui levar o Penev para o Paços de Ferreira; que achava que o Dínamo Tbilisi era a maior potência da Europa de Leste em 98; que dei a Hugo Pinheiro e Tó Madeira a titularidade no Real Madrid. 

Tó Madeira existe mesmo (mas marca menos golos)

Eu, que ganhei a Liga dos Campeões com o Chievo Verona num imaginário 2006 (à primeira,que com batota é mais fácil); que vi Tsigalko marcar sete golos ao V. Setúbal no mesmo jogo; que perdi a paciência vezes sem conta com o Shakhtar Donetsk que me pedia um balúrdio pelo Aghahowa.

Eu também vi a mensagem que me mandava mudar de roupa interior. Também disse de Adu ou Rentería: «No FM é craque!».

Mas fartei-me. Porquê? Não sei bem, mas acho que foi do detalhe. Há dois anos já nem uma temporada completei, no ano passado nem instalei o jogo, este ano nem quis saber. Para mim é passado.

Perdi a paciência para conferências de imprensa (as vezes que eu saí de rompante!), para treinos individuais, para buscas pelos melhores em finalização, passe e jogo de cabeça, para mandar o adjunto dar as palestras.

O problema é que o FM deixou de ser, para mim, o que deveria ser por essência: um jogo. Hoje é uma ferramenta, uma base de dados de luxo à qual tiro o meu chapéu.

Mas, no fundo, é como os telemóveis de última geração, que servem para ir à internet, enviar e-mails, tirar fotografias, editá-las, filmar ou jogar. E às vezes nem encontrámos o básico: o sítio para fazer chamadas.

E o FM é isto. Tornou-se isto. É um jogo profissional. Desses, peço desculpa, mas passo.

Prefiro o Elifoot. O velhinho, que cabia inteirinho numa disquete. Desse não me lembro de uma má memória.

Quem não conhece, quem está habituado às 1001 opções, aos treinos detalhados, às dezenas de características para cada jogador, nunca vai saber o prazer que é fazer um campeonato inteiro em hora e meia.

O que há para não gostar num jogo em que há uma opção que diz literalmente: escolher os melhores. É a melhor tática de sempre! Alt-F2 e lá vão eles. Até podem ser oito defesas e dois avançados. Se são os melhores, são eles que jogam.

Como esquecer as tardes a jogar em grupo, que obrigavam a definir regras à priori para o leilão de jogadores (não havia outra forma de controlar). Havia a versão simples: o nome que aparecer primeiro tem preferência. E a versão dramática: enquanto um faz a proposta os outros fecham os olhos. E ai de quem fizer batota! Era discussão para interromper o jogo por uma hora.

Há algo melhor do que ser despedido por uma mensagem, com fundo negro e letras amarelas a dizer que «você não vale a ponta de um corno»?

O que pode ser mais desafiante do que levar o União de Lamas da 4ª à 1ª Divisão e tentar levar todos os jogadores ao número 50 de força. Sim, porque ali não há finalização, passe, remate, desarme...A força é tudo. É o futebol dos 80's.

Por isso, enquanto me despeço das boas memórias do FM, lembro com saudade os tempos do Elifoot. Do MS-DOS. Não tinha Tó Madeira, mas tinha Bambo. Ou Fua, Carlos Zara e Rudi. Menos populares, igualmente mortíferos.

Ao nome que aparecia debaixo do logotipo e que não faço ideia sobre o que faz hoje em dia, fica a minha homenagem: André Elias, vai daqui um abraço. Obrigado pelas memórias. 

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