«Erros meus, má fortuna, amor ardente», escrevia Luís de Camões, o poeta que provavelmente melhor verteu em palavras a alma lusa.

Neste duelo ibérico, o FC Porto foi o mais português possível, naquele sentido luso de estar quase lá tão perto da glória e por um pormenor não conseguir o que tanto fez por merecer.

A equipa de Conceição batalhou de forma incansável, naquela terá sido a melhor prova de competência desta época – a par da vitória frente ao Shakhtar também nesta liga dos Campeões –, e acabou por cair de pé frente ao Barcelona dos Joões, Félix e Cancelo, do goleador Lewandowski, do maestro Gundogan, dos prodígios Yamal e Gavi. Enfim, frente a uma equipa de outro patamar.

O FC Porto-Barcelona é um jogo arrepiante. Por ver aquela «a multidão num grito só de todos nós», como cantava Maria Amélia Canossa, por sentir que «Todo o campo é um clamor», como cantava Juan Manuel Serrat. Pela pele de galinha dos violinos e do coro celestial ao ouvir «The Chaaaampiooons…». Pelas 49 722 gargantas gritaram por 90 minutos, mais descontos; pelos assobios que ecoavam nos ouvidos de João Félix a cada toque de bola; pelo relato frenético dos dois radialistas espanhóis que, aqui ao lado, gritam e vivem o jogo como se o coração lhes saltasse pela boca.

O FC Porto-Barcelona é também um duelo identitário de dois clubes-bandeira das suas regiões, bastiões incontornáveis resistentes aos centralismos da Ibéria – que hoje teve a boa notícia de saber que lá para 2030 vai organizar um Mundial.

Olhando para o relvado, este FC Porto-Barcelona foi um emocionante jogo de futebol entre as duas melhores equipas deste Grupo H.

Sem a experiência de Pepe e Marcano no eixo da defesa, além de Veron e Zaidu, Conceição apostou no mesmo onze da Luz: com Romário Baró de início.

O 4-4-2 desdobrava-se com facilidade até ao último terço, mas aí faltava classe a definir. Coisa que do outro lado o 4-3-3 de Xavi tinha de sobra. Com o teenager Yamal, que esta noite, com apenas 16 anos, bateu o recorde de mais jovem de sempre a ser titular num jogo da Liga dos Campeões, e sobretudo com João Félix, assobiado fortemente a cada toque na bola – ao contrário do que aconteceu com João Cancelo, o outro português em campo pelos «culés».

Taremi caiu na área, puxado por Koundé num lance, aos 20m, em que o Dragão clamou penálti. Lewandowski, por sua vez, lesionou-se num lance com David Carmo e acabou por ser substituído aos 34m por Ferrán Torres, o herói improvável desta batalha.

O drama de Romário Baró

Mesmo sem o seu goleador, quando chegava, o Barça chegava com perigo. Félix tentava, Diogo Costa respondia. Até que aconteceu um erro monumental e o Dragão gelou.

Aos 45m, Romário Baró, provavelmente o jogador mais azarado do plantel do FC Porto, entregou o ouro ao bandido, oferecendo em bandeja de prata uma bola a Gundogan, que tratou de isolar Ferrán Torres para o golo que acabaria por resolver a partida.

Que drama ali à beirinha do intervalo! Varela consolou Baró, Conceição tirou a camisola e saiu diretamente para o balneário. Uma frustração imensa. Um silêncio sepulcral.

O público do Dragão não deixou cair aplaudiu o médio, quando saiu aos 64m.

Mas, se Baró errou, o que dizer de Pepê, que aos 53m isolado por Taremi desperdiçou um golo cantado?

Mesmo com uma grande exibição, começando ao lado de Taremi na frente de ataque e acabando a lateral, o brasileiro acabou por desiludir num momento crucial numa segunda parte em que o FC Porto esteve claramente por cima.

Conceição arriscou e o FC Porto rondou o golo de forma quase insaciável, sem nunca o alcançar. Um penálti marcado e revertido, um golo numa monumental bicicleta de Taremi que foi anulado na hora por fora de jogo, a expulsão de Gavi já perto do fim... Enfim, uma sofreguidão que acabou com a equipa exausta e exangue, prostrada no campo de batalha.

O FC Porto errou e pagou por isso, bem pode reclamar da falta de fortuna, mas nunca do amor ardente, exacerbado em noites como esta.  

O FC Porto perdeu, fica em igualdade pontual com o Shakhtar, que esta noite venceu em Antuérpia (3-2 com reviravolta), mas deixou o relvado sob aplausos e com uma merecida volta de honra.

Época após época, com maior ou menor qualidade nas opções, com Conceição há um princípio inegociável, como que escrito numa pedra de granito: esta equipa tem chama, uma chama que nunca se apaga.