«Desculpem se ofendo, mas o Sp. Braga é candidato ao título», disse Conceição na antevisão do jogo. Abel respondeu: «É muito fácil criar expetativas e colocá-las nas mãos dos outros.»

Na verdade, este Sp. Braga não pode ofender-se por aspirar a mais do que aquilo a que está obrigado: líderes da Liga, a par do FC Porto, os minhotos apareceram no Dragão a única equipa invencível em jogos oficiais. Até hoje.

Esta noite, em casa do campeão, que melhor oportunidade para ver in loco de que é feito este candidato?

Sem Europa e com mais descanso do que os portistas, que venceram na última terça-feira o Lokomotiv (4-1), os «Guerreiros» quase superavam o tira-teimas.

A diferença de um campeão para um candidato está no quase.

Se os minhotos «tocaram ferrinhos» – já lá vamos às duas bolas na trave de Casillas – o dragão cuspiu fogo no último suspiro e embalou para a liderança isolada da Liga, em vésperas de paragem para as seleções, com mais três pontos do que o Sp. Braga – mais cinco do que Sporting e sete do que o Benfica, rivais que têm menos um jogo.

FC Porto-Sp. Braga, 1-0: ficha e filme do jogo

Recuando às suas palavras da antevisão do jogo, que abrem esta crónica e deram o mote ao jogo grande da 10.ª jornada, Abel criou de facto expetativas ao apresentar-se esta noite como equipa grande no Dragão, num 4-4-2 com Paulinho a fazer companhia Dyego Sousa, melhor goleador da Liga (7 golos). A única mudança relativamente à jornada anterior foi a entrada de Ricardo Horta no lado esquerdo do meio-campo em substituição de Fábio Martins.

No FC Porto, Conceição também só fez uma alteração, ao tirar Herrera para fazer entrar Soares, não inscrito na Liga dos Campeões.

Este 4-4-2 portista é um misto de artistas e operários. Marega e Soares trabalham que se fartam lá na frente, desgastando a defensiva contrária. Nas suas costas, porém, há magia à solta com Corona, Óliver e Brahimi.

Óliver e Marega. Foquemo-nos nestes dois. Soa estranho na mesma ideia de jogo caberem jogadores tão díspares: o maliano, que fez o 100.º jogo na Liga, é uma locomotiva, o espanhol, que completou hoje 24 anos, baila sobre a bola como um Fred Astaire dos relvados.

Potência e delicadeza, trabalho e talento, é deste misto que se faz o FC Porto de Conceição.

A versatilidade portista quase que não chegava para ultrapassar este Sp. Braga, que veio ao Dragão discutir o resultado. Ainda assim, ao intervalo, o domínio era dos da casa em remates (11-6), posse de bola (64%-36%) e cantos (6-3). Equilíbrio só nas oportunidades de golo flagrantes: se Brahimi na cara de Tiago Sá lhe permitiu a defesa (43’), de um lado, já antes, do outro, Dyego falhara a emenda à boca da baliza (25’).

O golo esteve bem mais perto no segundo tempo. O Sp. Braga pressionava alto a saída de bola do FC Porto e aproveitou a quebra física do adversário, com menos dois dias de descanso, e os desequilíbrios notórios na defesa da casa para fazer tremer o Dragão.

Excluindo o golo, os minhotos tiveram as duas melhores oportunidades do segundo tempo: Ricardo Esgaio apareceu solto sobre o lado direito da área a disparar fortíssimo à trave, aos 56’. Aos 79’, de novo bola no ferro, com um pontapé à meia-volta de Fransérgio.

FC Porto-Sp. Braga, 1-0: destaques do jogo

Sérgio Conceição teve mérito. Com a equipa em perda, decidiu arriscar. Aos 63’, tirou Maxi e fez entrar Otávio (de novo decisivo!) e puxou Corona, quase sempre bem anulado por Sequeira, para lateral direito. Dez minutos depois, alterou o sistema, de um 4-4-2 para um 4-2-3-1, ao tirar Brahimi para colocar Herrera, reforçando o meio-campo. O mexicano ficou ao meio, com Marega a ser puxado para o lado direito do ataque e Otávio desviado para o lado contrário.

Conceição arriscou e ganhou. A sorte protege os audazes e a dois minutos dos 90, quando o nulo parecia persistir, o Dragão entrou em ebulição, lançou chamas e voou para a liderança isolada: cruzamento perfeito de Otávio na direita e o combatente Soares desferiu de cabeça o golpe que tombou os «Guerreiros».

«Nos pequenos pormenores estão as grandes diferenças», dizia um anúncio televisivo de um automóvel, há uns bons anos. O futebol é também assim. Pode ser um centímetro abaixo ou acima, mas é esse «quase» que define as diferenças entre candidatos ao título.

Hoje, essa máxima voltou a vigorar. Não há ferro que resista à fibra de um campeão.