Um mundo dominado e confundido pelos efeitos da crise financeira na economia real está à espera do que se vai decidir no encontro que começa esta quinta-feira em Londres. A reunião do G20 é já entendida como palco para uma resposta dos principais governos: estarão todos a pensar na cooperação global ou cada um procura por si as soluções que mais se lhes adequam?

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, respondeu às objecções do homólogo francês, Nicolas Sarkozy, e admitiu que o consenso não abrangerá todos os temas.

E onde está Portugal no meio destas negociações? É um frágil espectador que, segundo o economista Mira Amaral, deve também «estar a rezar a todos os santinhos» para que o encontro traga consigo soluções. Até porque, como avança o também presidente do banco BIC, «a capacidade do Governo português para salvar tudo e todos é uma perfeita fantasia».

Numa palestra sobre a crise financeira, que decorreu esta quarta-feira no Instituto Superior Técnico, em Lisboa, Mira Amaral explicou que os programas públicos anti-crise a nível mundial já valem 4 por cento do Produto Interno Bruto (PIB) global, mas a postura dos Estados Unidos face à União Europeia é claramente díspar nesta reacção.

«A Reserva Federal norte-americana cria moeda para financiar directamente empresas e consumidores. A Alemanha, que é o país mais forte da Zona Euro, não deixa que o Banco Central Europeu (BCE) faça o mesmo porque teme a escalada de inflação», reconheceu no mesmo encontro.

Resultado desta diferença de postura? Os EUA estão a gastar dinheiro, mesmo sob o risco do dólar perder demasiada credibilidade internacional.

«A Europa é mais lenta a reagir à crise, porque os EUA têm um governo a comunicar com um banco central. Nós temos o Banco Central Europeu mas não um só governo europeu, que sirva de interlocutor directo», diz Mira Amaral.

Os outros players

Por isso mesmo, neste G20, França e Alemanha preferem mais regulação financeira a mais pacotes económicos, enquanto Obama apela a consensos e novas ajudas.

No meio, há outros players que vão querer vincar o seu lugar: a China está a braços com uma quebra massiva de exportações e não quer perder o lugar de grande potência mundial; a Índia e o Brasil também; o Canadá quer perceber se deve continuar a seguir o modelo americano em muitas questões e em que ponto fica a debilitada indústria automóvel; a Rússia quer evitar o cenário de recessão cada vez mais iminente; a Arábia Saudita vai defender os interesses da OPEP e perceber ainda a real dimensão do recuo global do consumo do petróleo; e o Japão tenta minimizar o maior recuo económico desde a II Guerra Mundial.

Portugal, o país «submergente»

E Portugal? Para Mira Amaral, «há países desenvolvidos, emergentes e os países submergentes», onde o nosso se enquadra.

«Há 10 anos que já vivemos numa crise profunda. Quando esta crise acabar, Portugal vai continuar com ela», defende. Onde estão os problemas? Segundo o mesmo economista, no endividamento «público e externo elevadíssimos», no Estado «pesado e opressor», na sociedade «cada vez mais desequilibrada».

Um dos mais graves problemas passa pelo facto do país dever quase tanto quanto aquilo que vale: «Com uma dívida pública muito alta, não somos competitivos», defende Mira Amaral.

Sobre soluções para o país, o economista disse ainda, no âmbito do mesmo encontro, que se deve reduzir a carga fiscal às empresas de bens transaccionáveis, deixar obras grandes de lado, como o TGV, e apostar em outras que «criem emprego e oportunidades a nível local».

Mira Amaral defende também que a aposta em áreas como as energias renováveis ou as redes de nova geração são «vitais para a competitividade», mas volta a alertar para o outro problema: é preciso reduzir a despesa pública corrente primária para 30% do PIB.