O procurador-geral da República referiu esta terça-feira no Parlamento que «há catálogos na Internet a anunciar a venda de material para escutas: ensinam como trabalham, como é que deputados e PGR podem ser escutados».
«Eu não posso impedir que me escutem», garantiu Pinto Monteiro, que aproveitou até para relatar o conselho do técnico que lhe instalou o telefone no gabinete. «Disse que se o procurador quisesse ter uma conversa mais secreta, então deveria ligar a televisão e falar perto dela». Perante isto, desafiou: «Então os senhores deputados não querem que eu diga que não controlo as escutas»?! Mais: «Algum deputado é capaz de garantir que não tem o seu telefone sob escuta?».
Estranho para o PGR é que não haja buscas para apreender, nomeadamente em feiras e mercados, o material utilizado nas escutas ilegais.
«Nunca vi buscas sobre a venda destes aparelhos. Vendem-se de 30 a 300 contos. Não vou pôr os procuradores a fazer buscas. Os órgãos policiais é que têm de as fazer», atirou.
O mesmo se passa em relação aos «detectives privados», uma actividade não regulamentada mas profusamente anunciada nos jornais. Se os deputados admitirem a actividade dos detectives privados, então o PGR aconselha-os a legislar. Caso contrário, a polícia terá de actuar.
«Disse aquilo que queria. E voltava a dizê-lo
«Disse aquilo que queria, foi uma atitude pensada. E voltava a dizê-lo. Pelo menos motivou uma discussão saudável sobre o tema», afirmou ainda o PGR, a propósito da entrevista ao semanário «Sol» em que admitiu ter um telefone sob escuta.
«Não brinco com a Justiça. Só por isto [audição no Parlamento] valeu a pena dar a entrevista que dei; só para ver aqui tantos senhores deputados», atirou ainda Pinto Monteiro.
O responsável máximo do MP reiterou que «as escutas (legais) têm sido exageradas» e que os deputados partilham da sua opinião já que «no actual Código de Processo Penal (artigo 187) as restringiram». «Só o arguido pode ser escutado e não o seu alfaiate a prima e a avó», ironizou.
«Não podemos viver sem escutas, mas não podemos fazer delas o único meio, fundamental», acrescentou.
Recados para o MP
Pinto Monteiro assume tratar-se de «um alerta para o Ministério Público» e que foi realizado através do jornal porque «o anterior procurador-geral da República (...) fez circulares e, pelos vistos, não deram resultado».
Ainda sobre as escutas legais, Pinto Monteiro reiterou: «Não peçam ao procurador que responda pelo que não controla», numa alusão ao facto de o Ministério Público não exercer controlo externo sobre as forças policiais, que executam materialmente as intercepções telefónicas. Não pretende controlar as polícias, mas verificar o cumprimento da lei.
Pinto Monteiro acolheu ainda a «boa sugestão» do deputado do PSD Fernando Negrão para a elaboração pelo PGR de «um guia de boas práticas no que toca à realização de escutas telefónicas».
Sobre a possibilidade de o poder político atribuir aos serviços de informações a realização de escutas telefónicas, defendida pelo ministro da Justiça, o PGR insistiu no «controlo jurisdicional das mesmas» e lembrou que essa medida implicará uma revisão constitucional.
A audição do PGR acontece na sequência do requerimento do deputado Nuno Melo do CDS/PP. «Se vexa suspeita estar sob escuta, nenhum outro cidadão pode estar descansado a esse nível», referiu o parlamentar.
Em resposta à pergunta «O que pensa da possibilidade de os serviços de informações fazerem escutas?», Pinto Monteiro afirmou na entrevista: «Eu vou dizer uma coisa com toda a clareza, que talvez não devesse dizer: acho que as escutas em Portugal são feitas exageradamente. Eu próprio tenho muitas dúvidas que não tenha telefones sob escuta. Como é que eu vou lidar com isso? Não sei. Como vou controlar isto? Não sei. Penso que tenho um telemóvel sob escuta. Às vezes faz uns barulhos esquisitos».
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7497 escutas telefónicas em 2007
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