É raro a confiança ganesa estar em baixo quando a seleção se prepara para um torneio internacional. Ainda assim, antes do Qatar 2022 as expectativas estão a ser geridas – e ainda bem que assim é. As Black Stars têm tido dificuldades nos últimos 12 jogos, vencendo apenas por duas ocasiões (e contra adversários fora top100 da FIFA).
Até o play-off a duas mãos frente à Nigéria que garantiu o lugar no Mundial não foi memorável por ser um grande espetáculo, apenas pela disciplina tática que produziu dois empates e os viu avançar pela regra dos golos fora. Não parece que o selecionador, Otto Addo, saiba qual é a sua melhor equipa no que toca a jogadores e táticas, continuando a mudar ambos. O antigo jogador do Borussia Dortmund e do Gana insiste que tem tudo sob controle. “Estou e estamos todos prontos para o Mundial”, disse o mês passado. «Conseguimos lá chegar e é porque merecemos. Vamos dar tudo. Provamos no passado que somos uma equipa de torneios. Sabemos que temos de melhorar, mas mal podemos esperar.»
O facto destas palavras virem no final da semana em que foram derrotas pelo Brasil (3-0), antes de uma vitória ‘à rasca’ frente ao Nicarágua fá-las soar um pouco ocas. A ideia geral é que Addo ainda está a ponderar como vai jogar no Qatar e só vai decidir no último momento. O leque de jogadores disponíveis e a jogar bem continua a aumentar. Parece que Addo vai para o torneio sem grandes preocupações com lesões, o que são boas notícias uma vez que não podem ter qualquer fraqueza num grupo com Portugal de Cristiano, Son Heung-Min a inspirar a Coreia do Sul e um Uruguaio cujo Gana tem assuntos inacabados
Otto Addo, que foi nomeado interino antes dos jogos do play-off frente à Nigéria, é apenas o segundo ganês – depois de Kwasi Appiah em 2013 – a levar o país do oeste africano ao Mundial. O facto de ter batido os grandes rivais foi um feito impressionante, tendo surgido na ressaca da pior prestação do país de sempre na CAN. Contudo os Black Stars falham em não terem capitalizado da eliminação da Nigéria, com a inabilidade de Addo em decidir uma tática, o que deixa os adeptos boquiabertos por vezes. Que quer uma defesa sólida é claro, mas além disso há pouca claridade. O facto de Addo não ter sido treinador principal em lado nenhum antes de chegar à seleção vai contra ele, mas trabalhou como “treinador de talentos” no Borussia Dortmund desde 2019, ajudando jogadores como Erling Haaland e Jude Bellingham a adaptar-se e a brilhar na Bundesliga. Outro ponto a favor é que Addo tem a experiência do antigo treinador do Newcaste, Chris Hughton, que é o conselheiro técnico do Gana, para interferir em questões táticas durante o torneio.
A forma de Thomas Partey com o Arsenal esta época aqueceu os corações dos compatriotas que esperam que transporte esse momento para o Mundial. O médio de 29 anos tem sido fundamental no bom início dos Gunners – no topo da Premier League e a voar na Europa – e parece que pode fazer o mesmo pela seleção. Partey foi chave na qualificação com 3 golos em 4 jogos, incluindo o golo decisivo, fora de casa, frente à Nigéria que selou o apuramento. «As estatísticas são visíveis e isso é inquestionável», disse Arteta no fim da época passada. «A percentagem de vitórias quanto o Thomas joga é simplesmente mais alta.»
Outra estrela ganesa na Premier League, Daniel Amartey foi de ser excedentário no Leicester a uma opção gradualmente mais importante para Brendan Rodgers. Pelo Gana a parceria no centro da defesa com Alexander Djiku já os levou tão longe, e Amartey deve continuar a ter um papel importante no Qatar mesmo com a emergência de Mohammed Salisu, do Southampton. Salisu pode saltar mais à vista, mas o que faz de Amartey um jogador chave para Otto é a sua versatilidade, podendo alinhar também como lateral-direito ou médio defensivo.
As figuras do desporto do Gana nunca se metem em geopolítica, e a comunicação social segue a deixa. Como tal, a abordagem à questão dos direitos humanos dos trabalhadores do Qatar tem sido insignificante, tanto da parte da seleção, do Governo, e mesmo da comunicação social ganesa. Com o país a lidar com uma crise económica que coloca em causa as necessidades mais básicas, assumir uma posição sobre o Qatar está longe de ser uma prioridade.
“God bless our homeland Ghana
And make our nation great and strong,
Bold to defend forever
The cause of Freedom and of Right;
Fill our hearts with true humility,
Make us cherish fearless honesty,
And help us to resist oppressors' rule
With all our will and might for evermore”
São estes os versos do hino nacional do Gana – mas nem sempre foi esse o caso. As letras originais, a uma música composta pelo falecido Philip Gbeho em 1957 (o ano em que o Gana ganhou a independência), foram substituídas nos anos 70 com uma nova versão escrita por Michael Kwame Gbordzoe. A popularidade do hino é refletida pelo quão alto e orgulhosamente os jogadores e adeptos o cantam – não tão alto como os italianos, mas lá perto.
Há uma razão pela qual Abedy Ayew ganhou a alcunha de “Pelé” durante os seus dias como jogador, usando-a durante tanto tempo que acompanhou o jogador como um dos seus nomes oficiais. Ayew – pai do atual capitão da seleção, André, do avançado do Crystal Palace, Jordan, e do médio a jogar em Gibraltar, Ibrahim – não marcou golos como a lenda brasileira, mas a sua mestria e elegância com a bola fazia lembrar O Rei. Agora com 57 anos, foi o primeiro ganês a vencer a Liga dos Campeões, brilhando na final em que o Marselha surpreendeu um grande AC Milan, e pelo Gana – durante uma carreira internacional de mais de uma década – foi talismã igualmente importante. Nunca chegou ao Mundial, mas viveu a experiência através dos seus filhos que, coletivamente, marcaram presença em 4 torneios.
O perfil da seleção do Gana foi escrito por Fentuo Tahiru Fentuo
Escreve para o Joy Sports