Há duas questões não-negociáveis com Luis Enrique: o estilo de jogo e o sistema de 4x3x3. Os jogadores entram e saem, mas essas são as constantes. De facto, os jogadores não são escolhidos por serem os melhores, nem os avançados por serem aqueles que marcam mais golos, mas pela sua habilidade conjunta de executar o plano. «Vamos para a vitória desde o primeiro minuto, sem nos preocuparmos muito com o adversário», disse. «Não queremos jogar recuados, queremos jogar no meio-campo adversário e correr riscos. Na defesa queremos tirar a bola dos adversários o mais rápido possível. Quando procuro jogadores para a seleção, escolho os que melhor interpretam as nossas táticas.»
Essa abordagem tem corrido geralmente bem para a Espanha, sob o comando de Luis Enrique, que conduziu a seleção às meias-finais do Euro 2020, nas quais perderam nos penáltis frente à seleção que acabaria vencedora do torneio, a Itália. A qualificação para o Mundial não foi acidentada, apesar da derrota com a Suécia, e lideraram o grupo na Liga das Nações (embora tenham sido surpreendidos com a derrota em casa, por 1-0, frente à Suíça).
Esta Espanha foi feita de forma a colocar pressão nos adversários enquanto jogam rápido desde trás, incluindo o guarda-redes. «Não é nada para se ter medo», disse o guarda-redes Unai Simón ao El País, falando sobre o estilo arriscado da Espanha durante o Euro 2020. «Se há avançados rápidos como Alexander Isak ou Mbappé, corres o risco de ser apanhado, mas ganhamos muito mais neste sistema do que os adversários. Independentemente da maneira como jogues, corres sempre riscos.»
Potenciais problemas que possam surgir para conquistar o torneio, como em 2010, são o facto da defesa jogar com uma linha tão subida que os adversários deverão sempre criar algumas oportunidades, para além da falta de um goleador consistente a nível internacional.
Luis Enrique chega ao Mundial com a esperança de levar La Roja ao patamar acima daquele a que levou no Europeu do ano passado. Foi apontado selecionador em 2018, depois de um Mundial caótico, mas abandonou quatro meses depois, por razões pessoais. No seu regresso disse que não queria trabalhar com o seu antigo adjunto, Robert Moreno, acusando-o de ser desleal. Tendo começado a carreira no Barcelona B, treinou Roma e Celta de Vigo antes de assumir a equipa principal do Barcelona, em 2014, vencendo o triplete (Liga, Taça do Rei e Liga dos Campeões) no ano seguinte. «Ele quer ver agressividade no nosso futebol», diz César Azpilicueta.
É difícil encontrar um jogador que se destaque neste plantel, em parte porque é assim que Luis Enrique quer. Para ele é tudo sobre o coletivo, e a equipa é a estrela. Ansu Fati, o jovem jogador do Barcelona, podia ser uma opção, mas tem sido atingido por lesões. Pedri é talvez a melhor opção, com a sua juventude a representar algo novo e fresco. Como Gavi, também. Pedri ainda só tem 19 anos – faz 20 durante o Mundial –, mas tem quase 100 jogos pelo Barcelona. «Se falarmos em talento puro ele é o melhor do mundo», diz o seu treinador, Xavi.
Já lá está há muito tempo, mas no papel de 'herói discreto' não há ninguém na seleção que desafie Sergio Busquets. O seu trabalho no meio-campo ainda é crucial para Luis Enrique. Quando a Espanha venceu o Mundial, em 2010, e o Euro, em 2012, os jogadores mais conhecidos eram Iker Casillas, Xavi, Andrés Iniesta e David Villa, mas é duvidoso que tivessem alcançado esse sucesso sem Busquets. Antes do Euro 2020 contraiu covid-19 e Luis Enrique recusou-se a chamar um substituto, dizendo apenas: «Não é que eu queira esperar pelo Busquets, é o que eu vou fazer. Assim que recuperar será chamado, de certeza.»
4x3x3
Unai Símón; Carvajal, Laporte, Pau Torres, Jordi Alba; Pedri, Busquets, Gavi; Dani Olmo, Morata e Nico Williams.
A Espanha está ciente dos problemas de direitos humanos no Qatar, e da situação dos trabalhadores migrantes, e o presidente da federação, Luis Rubiales, disse recentemente que estava em negociações com a FIFA para que os jogadores pudesse usar uma braçadeira com uma mensagem sobre direitos humanos. «Estamos a conversar com a FIFA porque queremos uma braçadeira em que todos os aspetos da igualdade – raça, orientação sexual, direitos humanos – estejam representados. Espero que consigamos. Se não, teremos de olhar a outros meios, incluindo arcos-íris no treino todos os dias.»
A Marcha Real é um dos poucos hinos no mundo sem letras. Teve-as no passado, e na década passada foram feitas competições para as acrescentar ao hino, mas a entrada vencedora foi tão criticada que acabou por ser anulada dias depois. Os adeptos espanhóis acrescentam alguma atmosfera aquando do hino, gritando “lo, lo, lo, lo, lo, lo”.
Se recuarmos muito tempo podemos dizer que Telmo Zarra era uma opção, pelo seu famoso golo que levou a Espanha à ronda final do Mundial 1950. Algumas décadas depois podia ser Jose Antonio Camacho, mas apenas um jogador deu um título mundial a Espanha, e esse alguém é Andrés Iniesta. O seu golo frente aos Países Baixos, em 2010, surgiu a apenas quatro minutos do final do prolongamento, depois de um jogo brutal, e não houve volta a dar para os neerlandeses, depois disso.
Textos de Ladislao Moñino Garcia, que escreve para o El País.